domingo, 16 de agosto de 2015

Daiane

Ontem à noite fui ao shopping. Detesto shopping. Ainda mais sábado à noite. Mas precisava comprar um presente para uma amiga que faz aniversário hoje e não tinha muitas opções àquelas alturas do final de semana.
Para não ter estresse com trânsito, briga por vaga e custo do estacionamento, decidi ir de bike. A noite estava propícia - fresca e seca. E o Higienópolis tem bicicletário.
Estacionei a bike e fui em busca de uma loja de lingerie. Meu estilo biker - cara limpa, cabelo curto e despenteado. camiseta regata, calça jeans velha, tênis, mochila nas costas com capacete pendurado contrastava com as mulheres ultra maquiadas, cobertas de grifes, que olhavam seus filhos e o resto do mundo do alto de seus saltos finos e por trás de suas louras franjas.
Uma loja com o sugestivo nome de intimissi (ou algo próximo disso) anunciava descontos de até 70% em suas rendadas mercadorias.
Entrei pra checar. Havia mais umas três freguesas, todas sendo atendidas por vendedoras solícitas. A loja esvaziou e nenhuma das vendedoras solícitas veio até mim perguntar o que eu queria.
Apesar de o preço estar realmente convidativo, não achei nada que combinasse com minha amiga. E, como não houve interesse de ninguém em talvez me ajudar a achar algo, virei as costas e fui embora.
Fui então à Jogê, onde imediatamente fui atendida por uma vendedora atenciosa, bem humorada, com um delicioso sotaque nordestino. Resolvi o assunto com um presente alegre que, imagino, alegrará minha amiga querida. Agradeci a ajuda eficiente e prestativa - na frente da gerente da loja.
Então decidi comprar um presente para o Theo.
Desci até a Centauro. Sabia o que queria comprar: uma bermuda para ele poder treinar musculação.
Logo que entrei na loja, Damiana se apresentou. Não gosto muito dessas lojas grandes, justamente porque os vendedores nunca estão por perto e, quando estão, geralmente atendem de má vontade.
Mas Damiana passeou comigo pela loja, mostrando as opções e sendo absolutamente sincera. "Nike, não. Muito caro e não é tão bom. Dá uma olhada neste aqui - é marca boa, e está em oferta porque é da coleção antiga." E assim, achei o que queria e ainda escolhi um short pra ele jogar bola também. Ela perguntou "não vai levar mais nada?", respondi que não dava, que compro uma vez pra cada filho e que não posso comprar muito pra cada um porque são muitos filhos.
Aí confessei pra ela "O meu mais velho merece. Ele trabalhou duro hoje. Ele está se esforçando. Ele merece." Meus olhos marejaram. E os dela também. "Eu sei", ela disse, "tenho um de dois anos, ele está na Bahia com a minha mãe". E sua voz embargou. Murmurou "sinto tanta falta dele..."
E como meu olhar a interrogasse, ela continuou "o meu marido, pai dele, está internado porque tem problema com drogas e eu não consigo dar conta sozinha".
E contou como se conheceram e como ele estava limpo há quatro anos mas depois foi seduzido de novo. E ela está sem o marido e sem o filho. A essas alturas estamos as duas chorando. E eu nem sequer sei o seu nome. Pergunto. Ela vira o crachá "Damiana". "Feminino de Damião, bonito!", comento. "Não gosto", responde ela, "prefiro que me chamem de Daiane". "Como a princesa?", pergunto. "Não. Como a ginasta". 
Então nos despedimos, com uma abraço forte e a promessa de que tudo vai dar certo. Pra ela. Pra mim. 
 

7 comentários:

  1. Não há como não se emocionar com os seus escritos. Eles nascem fundo. Eles tocam fundo. Você é uma das minhas cronistas favoritas. Bravo, Claudia Aratangy!

    ResponderExcluir
  2. "Intimissi" what??????"

    Eu ri...e muito!

    Mas depois os olhos marejaram...

    Se você for fazer eu passar por essa montanha russa toda vez...

    Pode deixar, na próxima apareço preparado.... ;-)

    Valeu a espera!!!

    ResponderExcluir
  3. Só fãs comentam? Só tem fãs? Porque eu não vou conseguir fazer diferente. Que texto lindo!!!

    ResponderExcluir
  4. Adorei o texto Cláudia, qual mãe não se emociona!!?? Bj

    ResponderExcluir
  5. Adorei o texto Cláudia, qual mãe não se emociona!!?? Bj

    ResponderExcluir