tag:blogger.com,1999:blog-958469927171017652024-03-13T19:02:19.121-07:00Peixe grande - pequenas históriasEscritos avulsos e dispersos. Às vezes é tudo verdade. Pode ter acontecido comigo ou com um amigo de uma amiga. Ou não.Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.comBlogger22125tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-19778353505780375542016-09-30T07:43:00.003-07:002018-03-25T08:09:14.254-07:00Bouncer<span style="background-color: #b6d7a8; font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;"><span style="font-size: 14px;">ERA 1986 e eu morava em Londres. </span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">A vida era dura, mas boa. Morava num “bedsit”, junto com meu namorado brasileiro, estudava inglês e trabalhava como diarista e baby sitter. Sim, diarista. </span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">Era uma excelente baby sitter e uma faxineira esforçada, mas sem jeito.</span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;"><b>Os Packman</b></span></span><br />
<span style="background-color: #b6d7a8; font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;"><span style="font-size: 14px;">Entre os meus clientes havia um casal muito simpático – os Packman. Eles moravam numa bela casa em Hampstead, tinha um filhinho de dois anos – David – e um cachorro de dez, o Bouncer. </span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">Todas as terças-feiras eu pegava minha bike e chegava lá na hora em que Mrs. Packman e David estavam terminando seu café da manhã e Mr. Packman chegava de sua volta com Bouncer.</span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">Na sequência, ele se preparava para sair. Beijava a mulher, o filho, acenava para mim e, invariavelmente, antes de fechar a porta, vira-se para o cão e dizia “bye bye, Bouncer, see you later!” ao que o animal respondia com um aceno de rabo e um latido.</span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">Uma meia hora depois Mrs. Packman e David também saiam e eu ficava na casa às voltas com louça, roupas, vasos, pias, chãos e móveis pra cuidar. E com Bouncer.</span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;"><b>O cão e o aspirador</b></span></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://4.bp.blogspot.com/-xQqgx0L_qNo/V-554f5eLWI/AAAAAAAAJh8/GeOqUOcgSis9dWP8rN-UsbMWa4SL9jo5gCLcB/s1600/BOUNCER.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><span style="background-color: #b6d7a8; color: black;"><img border="0" height="320" src="https://4.bp.blogspot.com/-xQqgx0L_qNo/V-554f5eLWI/AAAAAAAAJh8/GeOqUOcgSis9dWP8rN-UsbMWa4SL9jo5gCLcB/s320/BOUNCER.jpg" width="214" /></span></a></div>
<span style="background-color: #b6d7a8; font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;"><span style="font-size: 14px;">Ele era um basset hound – aquela raça que arrasta orelhas pelo chão e –, pelo que poderia ser observado nos porta-retratos da sala, fazia parte da família desde antes do casamento, pois numa das fotos, ele está posando à frente dos noivos, com uma cartola e uma gravata-borboleta semelhante à de Mr. Packman.</span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">Os “bouncers” são seguranças de casas noturnas. Mas Bouncer não me parecia um segurança muito respeitável.</span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">Quando os Packman saiam, eu vestia as luvas de borracha, sintonizava o rádio na BBC e começava minha labuta. Bouncer me acompanhava silenciosamente, vigiando meus passos. Seu ponto fraco era o hoover – aquele aspirador de pó em pé, que aparecia em desenhos animados dos anos 70. Era só eu ligar o eletrodoméstico que ele se arrepiava e começava a latir. E não parava até que desligasse. Não me deixava em paz. Aliás, não deixava o hoover em paz. Conforme eu avançava e recuava, aspirando o pó do carpete, ele também avançava e recuava, como se duelasse. Acho que ele tinha medo que aspirasse suas orelhas que arrastavam pelo chão. Este era nosso único momento de tensão. De resto, nos dávamos muito bem.</span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;"><b>Encanadores</b></span></span><br />
<a href="https://4.bp.blogspot.com/-GjFwFLevYYw/V-556W6zvGI/AAAAAAAAJiA/BJr2hzEYE9QtE-g8tOe15ROrX31w2GndACLcB/s1600/Hoover.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><span style="background-color: #b6d7a8; color: black;"><img border="0" src="https://4.bp.blogspot.com/-GjFwFLevYYw/V-556W6zvGI/AAAAAAAAJiA/BJr2hzEYE9QtE-g8tOe15ROrX31w2GndACLcB/s1600/Hoover.jpg" /></span></a><span style="background-color: #b6d7a8; font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;"><span style="font-size: 14px;">Um dia, antes de sair, Mrs. Packman me avisou que havia contratado uma equipe de encanadores para resolver um problema de cano quebrado no jardim. E, de fato, uma hora depois de todos saírem, os encanadores chegaram.</span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">Deixei-os no jardim e subi para passar roupa. Bouncer seguiu para o jardim com eles.</span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">Um tempo depois, desci para aspirar o pó. Esperei Bouncer aparecer para começarmos nossa batalha. Liguei o aparelho, comecei o serviço, mas nada do cão aparecer. Estranhei. Fui até o jardim na parte de trás da casa, onde os homens trabalhavam. Não estava à vista. “Did you see the dog?” perguntei aos encanadores. Eles me olharam de volta, com cara de “que dog?”</span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;"><b>Sumiço</b></span></span><br />
<span style="background-color: #b6d7a8; font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;"><span style="font-size: 14px;">Comecei a chama-lo. Fui pra sala e então notei que a porta da rua estava aberta. Provavelmente um dos encanadores tinha ido à van buscar alguma coisa e tinha esquecido de fechar. Gelei.</span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">Comecei a gritar “Bouncer, Bouncer!” cada vez mais alto. Nada.</span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">Saí pela rua gritando. Na minha cabeça já estava imaginando a cena. Como eu iria comunicar aos Packman o desaparecimento do ente querido. Cogitei pegar minha bicicleta e desaparecer. Nunca mais voltar. Eles não sabiam onde eu morava, na época não existia nem Facebook, nem celular... Não seria fácil eles me encontrarem. </span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">Continuei descendo a rua e gritando. Não. Não fugiria. Eu poderia culpar os encanadores. Até porque eles eram mesmo culpados. Ainda assim, teria que dar a notícia. Não ia ser fácil.</span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">Quatro quarteirões adiante, quando já estava me conformando com minha sina, avistei Bouncer num jardim, cercado de flores e tentado montar num(a) galgo. Toquei a campainha da casa e, muito sem jeito, expliquei à senhora que atendeu o que estava acontecendo. Ela apressou-se em espantar o intruso dali, antes que houvesse chance de ocorrer uma mistura de raças. </span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">Peguei o bicho no colo – ele era bem pesado – e fui levando de volta à casa.</span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">Certifiquei-me de que a porta estava bem fechada e fui buscar o hoover para duelarmos. </span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">Aguardei os encanadores irem embora para poder trancar a porta, deixar a chave no lugar combinado e ir embora.</span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;"><b>Silêncio</b></span></span><br />
<span style="background-color: #b6d7a8;"><br /></span>
<span style="background-color: #b6d7a8;"><br /></span>
<span style="background-color: #b6d7a8; font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;"><span style="font-size: 14px;">Nunca contei aos Packman o ocorrido.</span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">Trabalhei mais alguns meses ali. Voltei pro Brasil. </span><br style="font-size: 14px;" /><span style="font-size: 14px;">Mas, até hoje, ainda lembro de Mr. Packman – “By bye Bouncer, see you later!”</span></span>Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-91429610043835700072016-07-18T18:55:00.000-07:002016-07-18T19:35:56.286-07:00Sem regras<div class="MsoNormal">
Tenho 52 anos. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Menstruei pela primeira vez aos treze. Estava ansiosa para
que isso acontecesse. É um marco para o qual fui devidamente preparada por
minha mãe, minhas tias, minha avó, minhas amigas mais velhas. E também por
propagandas de absorventes.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Desde então, minha vida passou a ser regrada. Todo o mês
sangue, todo o mês um pouquinho de cólicas, todo mês um novo ciclo. Junto com a
lua, ou quase. Um atraso poderia causar pânico. Ou, mais tarde, criar
expectativa.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Três vezes a menstruação não veio. Três vezes eu estava
grávida. E a gravidez é um outro ciclo, com mais luas, mas também um ciclo de
fases, que termina lindamente.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Então vem o puerpério – uma fase sem regras – que também
pode ser muito difícil para as mulheres, e sobre a qual também pouco se fala.
Não combina com a idealização da maternidade o desejo de atirar a própria cria
contra a parede ou de se lançar pela janela do apartamento.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Não fui pega pela depressão pós-parto. Dei sorte. Hoje,
ingressando na menopausa, me pergunto se não haverá semelhanças entre esses
períodos em que não temos regras.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
A diferença é que se, por um lado, agora não tem nenê, por
outro, não tem volta. As regras não voltarão.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
TPM, leve dor de cabeça, palidez, cólicas (ou não). O sangue
vinha e levava o mau-humor, a dor de cabeça e, mais um dia, também se iam as
cólicas. Alívio, distensão. Dali duas semanas, muitas vezes, sentia a ovulação.
Com ela, picos de libido e de energia. Passados mais uns dias, tudo recomeçava.
Durante 40 anos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
A gente é preparada para “virar mocinha”. Para a gravidez. Para
o parto. Para cuidar do bebê. Para amamentar.
Mas não para deixar de ser fértil.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Está difícil não ter mais regras, não ter mais ciclo, não
ter mais sangue mensalmente.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
O sangue vem e vai, desordenado. Hora em gotas de ferrugem,
que pingam como uma torneira defeituosa, hora como um tsunami vermelho
vivo, sem aviso, e pode me inundar no meio de uma reunião, num restaurante, me
obrigando a pedir desculpas para correr ao banheiro e perceber que será preciso
comprar uma calça e jogar a calcinha no lixo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Não é mais T-P-M. É só T. Uma gigantesca T. Que não tem dia
para chegar. Que não tem dia pra ir embora. Que vem de supetão, nas mais
variadas formas de catástrofe mental. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<i>Os gêmeos AINDA não
chegaram da escola? Deviam ter chegado há 10 minutos! 10 minutos! Morreram.
Foram atropelados. Foram sequestrados. Sou péssima mãe. Sou uma idiota. Estou velha.
E feia. Horrível. Nada do que faço é bom. Abandonei meus amigos. Não sei mais
ser amiga. Não sei mais ser filha. As pessoas são TÃO irritantes. Essa pentelha
viu a mensagem e não me responde. Responde! Responde! Respondeee, caralho. Por que
o telefone está tocando? Quem é o pentelho? Por que a gaveta não fecha? Por que
essa PORRA DE GAVETA NÃO FECHA? Por que eu inventei de fazer faculdade? Não vou
conseguir terminar. Não vou passar na OAB. Onde está minha chave de casa? Por que,
meu Deus, porque eu não deixo a chave no mesmo lugar? Eu não devia estar aqui correndo, eu devia
estar estudando. Eu não devia estar estudando, eu devia estar lendo aquele
relatório. Eu não devia estar lendo este relatório, eu devia estar com meus
filhos. Eu não devia estar com meus filhos, eu devia ir visitar meus pais. Minha irmã. Ir no supermercado. Passar mais
tempo com meu marido. Marido. Eu vou esfaquear o marido. Ele ronca de propósito pra não me deixar dormir! Isso não vai dar certo.
Aquilo também não vai dar certo. Aquilo outro? Vai dar errado. Onde
deixei os meus óculos? Por que, meu Deus, eu não guardo os óculos? Justo hoje,
justo hoje tinha que acabar a luz? Tinha que acabar o gás no meio do meu banho?
O avião vai cair. É claro que vai cair. Vou morrer. Acabou. Cadê a minha blusa
vermelha? Cadê minha blusa vermelha? Por que quando eu teclo cadê, escreve
cad~e?? Saco. Saco de teclado. Quem tirou minha caneta daqui? Quem comeu a última fatia do MEU pão? Não vou
dar conta. Não vou dar conta. De fazer. De pagar. De entregar. De educar. De
estudar. De viver.<o:p></o:p></i></div>
<div class="MsoNormal">
Acordo e estou diante de um abismo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
No meio do dia, sinto que sou capaz de provocar tremores se
pisar com um pouco mais de força.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Ao entardecer, não tenho forças.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Deito e me vejo no meio de um ciclone.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Ou acordo no meio de um ciclone.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
No meio-dia estou diante de um abismo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Ao entardecer provoco tremores.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
À noite não tenho forças.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Ou. Não sei. Não tem ordem certa. Não tem regras. Pode ser
um dia assim. E outro normal. E outro dia assim. Podem ser dez dias assim. Dez
dias assim. <o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
E não adianta você saber que são os hormônios. <o:p></o:p></div>
Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-14187128632108573022016-06-30T16:27:00.002-07:002016-06-30T17:14:58.692-07:00Você conhece o Kevin Johansen?<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Nunca ouviu nada dele? Pre-ci-sa ouvir.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
É o melhor compositor e intérprete da atualidade. E olha que
nunca fui muito chegada em música cantada em castelhano. Não, ele não é
espanhol, é argentino. Na verdade, é americano, nascido no Alaska. O pai é
americano, a mãe, argentina. Ele em canta em inglês também. Algumas vezes
mistura as duas línguas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
O gênero? Hummmm. Difícil responder. Uma vez, um jornalista perguntou
como ele definiria seu gênero musical já que transita por diferentes ritmos,
línguas e culturas. Ele respondeu, sem pestanejar “yo soy um degenerado”. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Meu degenerado favorito vai do country (Susan Surrender) ao
calypso (Apocalypso), da ciranda (el Círculo) à procissão (La Procesión), do
rock (McGuevara O Chedonalds,) à cumbia
(Cumbiera intelectual), passando pela balada romântica (mas jamais melosa, como
Te quiero), pelo blues (Down with my baby), bossa nova (You are the Bossa), tango
(La Tangómana), indígena da América do Norte (Whyoh), música dos pampas (Vecino), milonga (Milonga
que pasó)... E essa é só uma brevíssima amostra.</div>
<table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: right; margin-left: 1em; text-align: right;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-V-q5_QT1Sz8/V3Wqyn0mMWI/AAAAAAAAJdc/83o6li3-NKgSPPOU38hwXAhQmyTdrB4lwCLcB/s1600/KEVIN.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; margin-bottom: 1em; margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" height="240" src="https://1.bp.blogspot.com/-V-q5_QT1Sz8/V3Wqyn0mMWI/AAAAAAAAJdc/83o6li3-NKgSPPOU38hwXAhQmyTdrB4lwCLcB/s320/KEVIN.jpg" width="320" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Eu e ele</td></tr>
</tbody></table>
<div class="MsoNormal">
Mas aí é que está. Mesmo que você identifique o gênero, ele
dá um jeito de transgredir – seja com uma letra absolutamente inusitada, com as
mudanças de uma língua para outra ou com a participação de algum convidado
especial. Se você quer colocá-lo numa
caixinha, esquece.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Degenerado e inclassificável.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Meu inclassificável favorito tem uma habilidade toda sua pra
jogar com as palavras, pra combinar e misturar o inglês, com espanhol (ou “estranhol”,
como ele mesmo diz) e ainda, de vez em quando, colocar umas pitadas do nosso português
com seu delicioso sotaque. Pra se ter uma ideia, a banda, que o acompanha há anos, chama The Nada, seu mais recente álbum "Mis Americas".<o:p></o:p><br />
Não bastasse compor com poesia e originalidade, interpretar
com voz terna e grave, ele ainda tem o atrevimento de recriar canções – pois não
dá pra dizer que são só versões. E suas escolhas são inusitadas: “Hotel
California” do Eagles, “Modern Love”, do David Bowie e “La Chanson de Prevért”,
de Serge Gainsbourg – sim, ele canta também em francês, “Since I Don't Have You”, dos Skyliners e
até Beatles, com “We can work it out” e Culture Club em “Karma Kamaleon”(essas,
só em vídeo).</div>
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
É música pra ouvir e dançar, pra ouvir e cantar junto, pra
ouvir e se emocionar, pra ouvir e rir, pra ouvir e pensar, pra ouvir e ouvir e
ouvir e ouvir e ouvir. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
Ouça. Tem tudo no Deezer. Deve ter no Spotify.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
E veja. Tem muitos vídeos no youtube. Ainda por cima, ele é
lindo. <o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
Depois que você ouvir, eu conto do show. <o:p></o:p></div>
Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-59675842857245928382016-01-17T13:06:00.004-08:002016-05-20T13:01:31.498-07:00Breve história de Estrela<a href="http://2.bp.blogspot.com/-o-h3t6y8bi4/VpwB-slR9zI/AAAAAAAAJS4/NN7uaLxiRsM/s1600/roupas.jpg" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://2.bp.blogspot.com/-o-h3t6y8bi4/VpwB-slR9zI/AAAAAAAAJS4/NN7uaLxiRsM/s320/roupas.jpg" /></a><span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;"><span style="background-color: white; color: #141823; font-size: 14px; line-height: 19.32px;">E</span></span>ra uma trans que estava sempre no Pão de Açúcar do Pacaembu. Magra, forte e simpática, me ajudava quando via que eu estava em apuros pra colocar as compras no carro, já que o carrinho fica escapando da gente no estacionamento de piso inclinado. Na primeira vez que isso aconteceu, agradeci e perguntei seu nome. Ela respondeu um nome qualquer de homem mas insisti: "como você GOSTA de ser chamada?" E ela, de olhos arregalados e sorriso discreto, apresentou-se: "Eu gosto de ser chamada de Estrela".<br />Desde então, toda vez que nos encontramos, a cumprimentei pelo nome. Uma vez ela pediu que comprasse um caixa de bombons para crianças que ela iria visitar. Ela não mendigava. Pedia olhando nos olhos, sorrindo, sem intimar, sem implorar. Gostei dela. Estava sempre ajudando as velhinhas do Pacaembu com suas compras, gentil e sorridente, sem histrionismo.<br /><br />
No final do ano, disse a ela que minha situação financeira não estava muito boa e que não poderia ajudá-la. Ela perguntou se eu teria algumas roupas usadas minhas pra lhe dar. Prometi que levaria no começo do ano.<br />Voltando de Ibiuna, antes de ir pra praia, separei as roupas, escolhendo com carinho modelitos que achei que ela iria gostar. <br />Passei duas vezes pelo supermercado mas não a vi.<br />Na segunda vez perguntei ao manobrista - que ficou surpreso pelo fato de eu me interessar por ela - mas ele não a via fazia uns três ou quatro dias. Como era logo depois do réveillon, talvez ela tivesse conseguido um dinheirinho pra visitar alguém. Deixei as roupas no carro.<br />Semana passada, nas duas vezes que passei por lá, não a vi.<br />Agora meu filho voltou do supermercado e me deu a notícia. "Mataram a Estrela".<br />Não tenho nem vontade de saber os detalhes. Posso imaginar e já é triste e chocante o suficiente.<br />Não saiu nos jornais. Não é notícia. É normal.<br />Estou de coração apertado por essa estrela de vida meteórica. Certamente vítima da pobreza e do preconceito. Choro por não ter entregue as roupas pra ela, por não ter me despedido, por não saber se alguém a pranteou, por não saber se foi enterrada como Estrela.Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-76456302500559456752015-08-16T09:04:00.001-07:002015-08-16T09:04:23.575-07:00DaianeOntem à noite fui ao shopping. Detesto shopping. Ainda mais sábado à noite. Mas precisava comprar um presente para uma amiga que faz aniversário hoje e não tinha muitas opções àquelas alturas do final de semana.<div>Para não ter estresse com trânsito, briga por vaga e custo do estacionamento, decidi ir de bike. A noite estava propícia - fresca e seca. E o Higienópolis tem bicicletário.</div><div>Estacionei a bike e fui em busca de uma loja de lingerie. Meu estilo biker - cara limpa, cabelo curto e despenteado. camiseta regata, calça jeans velha, tênis, mochila nas costas com capacete pendurado contrastava com as mulheres ultra maquiadas, cobertas de grifes, que olhavam seus filhos e o resto do mundo do alto de seus saltos finos e por trás de suas louras franjas.</div><div>Uma loja com o sugestivo nome de intimissi (ou algo próximo disso) anunciava descontos de até 70% em suas rendadas mercadorias.</div><div>Entrei pra checar. Havia mais umas três freguesas, todas sendo atendidas por vendedoras solícitas. A loja esvaziou e nenhuma das vendedoras solícitas veio até mim perguntar o que eu queria.</div><div>Apesar de o preço estar realmente convidativo, não achei nada que combinasse com minha amiga. E, como não houve interesse de ninguém em talvez me ajudar a achar algo, virei as costas e fui embora.</div><div>Fui então à Jogê, onde imediatamente fui atendida por uma vendedora atenciosa, bem humorada, com um delicioso sotaque nordestino. Resolvi o assunto com um presente alegre que, imagino, alegrará minha amiga querida. Agradeci a ajuda eficiente e prestativa - na frente da gerente da loja.</div><div>Então decidi comprar um presente para o Theo.</div><div>Desci até a Centauro. Sabia o que queria comprar: uma bermuda para ele poder treinar musculação.</div><div>Logo que entrei na loja, Damiana se apresentou. Não gosto muito dessas lojas grandes, justamente porque os vendedores nunca estão por perto e, quando estão, geralmente atendem de má vontade.</div><div>Mas Damiana passeou comigo pela loja, mostrando as opções e sendo absolutamente sincera. "Nike, não. Muito caro e não é tão bom. Dá uma olhada neste aqui - é marca boa, e está em oferta porque é da coleção antiga." E assim, achei o que queria e ainda escolhi um short pra ele jogar bola também. Ela perguntou "não vai levar mais nada?", respondi que não dava, que compro uma vez pra cada filho e que não posso comprar muito pra cada um porque são muitos filhos.</div><div>Aí confessei pra ela "O meu mais velho merece. Ele trabalhou duro hoje. Ele está se esforçando. Ele merece." Meus olhos marejaram. E os dela também. "Eu sei", ela disse, "tenho um de dois anos, ele está na Bahia com a minha mãe". E sua voz embargou. Murmurou "sinto tanta falta dele..."</div><div>E como meu olhar a interrogasse, ela continuou "o meu marido, pai dele, está internado porque tem problema com drogas e eu não consigo dar conta sozinha".</div><div>E contou como se conheceram e como ele estava limpo há quatro anos mas depois foi seduzido de novo. E ela está sem o marido e sem o filho. A essas alturas estamos as duas chorando. E eu nem sequer sei o seu nome. Pergunto. Ela vira o crachá "Damiana". "Feminino de Damião, bonito!", comento. "Não gosto", responde ela, "prefiro que me chamem de Daiane". "Como a princesa?", pergunto. "Não. Como a ginasta". </div><div>Então nos despedimos, com uma abraço forte e a promessa de que tudo vai dar certo. Pra ela. Pra mim. </div><div> </div>Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com7tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-72025011012004715662015-05-05T13:57:00.001-07:002015-05-05T13:57:56.498-07:00Nariz<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Chamou as duas filhas, sentou-as à sua frente. Mais séria do que de costume, procurava as palavras.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- A Catarina, minha chefe, vem jantar aqui hoje.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">As meninas esperam que a mãe prossiga.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- É muito importante que vocês se comportem.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Elas se entreolham. Que conversa era aquela?</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- É que... é que ela tem uma coisa que...</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A mais velha rompe o silêncio:</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Ela é “portadora de deficiência”?</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Não! –responde categórica.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Dá um suspiro. Desabafa:</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Ela tem um nariz enorme. Gigantesco.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A dupla cai na gargalhada. A menor:</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Que nem o do Pinóquio?</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Ela relaxa.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Na verdade parece um tubarão!</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Gargalhadas de novo.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Fica séria.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Mas vocês não podem falar isso pra ela. Não podem nem falar sobre o nariz dela uma com a outra quando ela estiver aqui. Não podem ficar olhando pro nariz. Entenderam?</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Mas e se a gente rir?</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Eu mato vocês!</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Sabem que é brincadeira. Mas ela baixa a voz e sussurra:</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Não façam isso. Eu preciso muito deste trabalho. Vocês sabem. Mas ela cismou de vir aqui. Quer conhecer vocês. Ela chegou do sul faz pouco tempo... sei lá. É importante pra mim que tudo saia bem. Vocês têm que fazer de conta que aquele nariz é a coisa mais normal do mundo. Nem dar bola pra ele. Posso contar com vocês?</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">As duas, lisonjeadas com tanta responsabilidade, balançam afirmativamente.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">***</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A cozinheira também é avisada. Além de preparar sua especialidade, não deve ficar encarando o nariz da chefe.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">As meninas já estão de banho tomado, penteadas, vestidas com as melhores roupas.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A mãe anda de um lado pro outro, experimentando as panelas e trocando os arranjos de flores de lugar.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A campainha toca.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O nariz chega.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">É fenomenal.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Mas as meninas ficam impávidas. Seguem à risca as orientações da mãe.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A mãe não tira as meninas do radar.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Quando a convidada leva o copo à boca, há um instante de tensão. A boca do copo é estreita. Será que ela vai conseguir? Será que as meninas vão aguentar ficar quietas?</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O nariz quase entala, mas, sua dona, já acostumada com tais situações, sabe qual o ângulo de aproximação exato para evitar incidentes.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Chega a sobremesa. As meninas estão cansadas. Pedem licença para ir dormir.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A dona do nariz comenta como as meninas são educadas. A mãe, discretamente, respira aliviada.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Vai até a cozinha. Seus passos estão leves.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Volta com a bandeja de café. Coloca sobre a mesa e pergunta, sorridente:</span></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Aceita um narizinho?</span></div>
Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-37660484066416666032015-05-05T13:55:00.003-07:002015-05-06T06:43:19.588-07:00Quem procura... acha? Ou o Y e a perna faltante<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/_pfmQRQzWb80/TIAc9NyfcZI/AAAAAAAAGLY/hrk_8H_8qJQ/s1600/mrmagoo.gif" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><img border="0" src="http://2.bp.blogspot.com/_pfmQRQzWb80/TIAc9NyfcZI/AAAAAAAAGLY/hrk_8H_8qJQ/s320/mrmagoo.gif" /></span></a></div>
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Será que o Y é manco, como diz minha amiga Thelma? Que costela de Adão que nada. No processo de criação, Deus se distraiu e, num acidente cortou aquela perninha. Mas é justo nela que deve estar a porção de DNA correspondente à capacidade de procurar as coisas. Ou vai ver que o Y é míope de nascença. Não que não saiba procurar, simplesmente não enxerga.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Exemplo?</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">1.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">XY: Cadê a tesoura grande?</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">XX: Está na segunda gaveta da cozinha.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">(Barulho de gaveta sendo aberta).</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">XY: Em que lugar? (estamos falando de UMA GAVETA, não de um armário)</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">XX: Do lado esquerdo.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">XY: Não tá aqui! (Note bem: a frase é "Não está aqui" e não "Não estou encontrando")</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E lá vai XX. Abre a gaveta, tira um guardanapo de cima, e lá esta ela, a tesoura. E não é pequena.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">XY: Ah, mas você não falou que tinha um guardanapo em cima.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">2.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">XX: Me faz um favor? Já que vai subir, pega os meus óculos que estão em cima da cama?</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">XY: Claro! (os XY são, geralmente, muito atenciosos)</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Dez segundos depois...</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">XY: XXiiiisssss! Não está aqui! (Note bem: a frase é "Não está aqui" e não "Não estou encontrando")</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">XX sobe as escadas vai até o quarto. Em cima da cama, há um objeto preto, uma caixinha. De óculos. XX pega e olha para XY. XY responde ao olhar, indignado: ah mas você <b>não disse </b>que estava no estojo.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span>
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">3.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Sábado eu estava com dor no meu ombro operado, deitada no sofá da sala, assistindo a um filme. Roi (meu marido e notório XY) perguntou se eu queria um remédio.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Eu: Sim, por favor! Traga a cartela de comprimidos que está no meu criado-mudo. Tem duas pilhas de livros, está em cima da pilha da esquerda. <b>Não está </b>nas gavetas. (Eu sabia que se estivesse nas gavetas, o manquinho não iria encontrar nunca).</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Quinze segundos depois....</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">XY: Claaau, não tá aqui! (Note bem, mais uma vez: a fase é "Não está aqui" e não "Não estou encontrando").</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Visto a tipóia e subo. Adivinha? Está lá. Na pilha da direita? Não. Dentro da gaveta? Não. Caída, atrás do criado-mudo? Não!!! Na pilha da esquerda? Sim!!! Mas então, está embaixo da pilha? Não!! Entre os livros? Nãããão! Está em cima da pilha, com um pequeno sachê cobrindo metade da cartela.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">XY: Ah, mas estava <b>escondido</b>!</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span>
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">***</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Além disso, suponho também que esteja na tal perninha faltante a capacidade de fazer várias coisas ao mesmo tempo e, certamente, uma porção da memória de curto prazo.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span>
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">No domingo, nosso filho Martim tinha um jogo de futsal importantíssimo. Ele é goleiro e costuma fazer a diferença. A partida é no fim do mundo, dobrando a esquina.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Vamos todos assistir.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O técnico, ao ver o Martim, respira aliviado. Então faz a pergunta fatal: trouxe o RG?</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Martim olha, aflito, pra mim. Eu olho com poucas esperanças para XY, digo, Roi. Ele não tem pra quem olhar. Não trouxe. Não leu o email até o fim, onde estava escrito "Levar o RG". Ele tenta se justificar, mas não há tempo a perder.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">XY, digo, Roi: Vou lá buscar.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Eu: Ok. Seja rápido.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Roi: Onde está o RG?</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Eu: Dentro da primeira gaveta do meu escritório, ao lado do computador.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Antes que ele pergunte "onde", sugiro: "Porque você não traz a gaveta? Assim não tem perigo de não encontrar!"</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E estava falando sério.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Ele sai apressado.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A partida que antecedia o jogo de Martim, termina. Nada de ele chegar.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Os meninos aquecem, o técnico tenta negociar com a arbitragem. Nada feito.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Meu celular toca. É XY.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">"Clau, a chave de casa está com você?"</span><br />
<br />Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-24685429970866542832015-05-05T13:53:00.001-07:002015-05-05T13:53:15.623-07:00Jalapaixão - 2ª parte<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-mQTRBTg0Kpc/UBA3hO17HrI/AAAAAAAAG2Q/u06ydX5ze1g/s1600/IMG_9984.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="480" src="http://2.bp.blogspot.com/-mQTRBTg0Kpc/UBA3hO17HrI/AAAAAAAAG2Q/u06ydX5ze1g/s640/IMG_9984.jpg" width="640" /></a></div>
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span>
<span style="background-color: white; font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">A noite cai. Não. Ali, a noite despenca. Do céu colorido à escuridão total, passam-se poucos minutos. Minutos nos quais a metamorfose das cores e luzes parece o trabalho de um artista temperamental, que, indeciso, não sabe que tons usar. Uma leve brisa sopra e o calor se esvai, deixando uma temperatura amena e agradável.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span>
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Durante o jantar, servido mais uma vez embaixo da mangueira, a turma começa a relaxar. Banho frio, cerveja gelada, petiscos saudáveis e saborosos, fazem a conversa fluir. Os meninos já brincam juntos. Os adultos, pouco a pouco, vão se apresentado. <span style="background-color: white;">As caras vão ganhando nomes, lugar de origem e ocupação.</span><span style="background-color: white;"> Os guias, bem humorados, também colaboram pra que o ajuntamento de pessoas passe a formar um grupo: conversam, fazem brincadeiras, contam causos.</span></span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Hora de dormir. A cama de sleeping, com colchão inflável, é surpreendentemente confortável. Meus vizinhos roncam. Uma gata no cio atormenta outros gatos. Galos, boêmios, resolvem cantar. Mesmo assim, levanto antes do sol e não me sinto cansada. Quando começa a clarear, saio para uma corrida.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span>
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Encontro Julio, voltando de uma caminhada na escuridão. Carlão, também acordado, está a postos com sua supercâmera sobre um tripé, para flagrar o nascer do sol. </span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span>
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">A estrada é basicamente plana, de terra basicamente dura. O combinado é que eu não saia da fazenda. André, um dos guias, me pediu que não saísse por medidas de segurança. Vai que encontro uma onça encerrando o expediente... Meu sprint não é tão bom assim.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span>
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Desencano do Ipod e corro ao som do Jalapão. As aves saúdam o sol que desponta. E imediatamente manda o friozinho pra longe.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span>
<table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: right; margin-left: 1em; text-align: right;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="http://4.bp.blogspot.com/-RZPuPJa95h0/UBAxtYOHwbI/AAAAAAAAG1g/c8WVxPS_kCk/s1600/DSC05505.JPG" imageanchor="1" style="clear: right; margin-bottom: 1em; margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" height="300" src="http://4.bp.blogspot.com/-RZPuPJa95h0/UBAxtYOHwbI/AAAAAAAAG1g/c8WVxPS_kCk/s400/DSC05505.JPG" width="400" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="font-size: 12.8000001907349px; text-align: center;">Rio do Sono</td></tr>
</tbody></table>
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">A próxima atração, é o Rio do Sono. Nosso primeiro encontro com as águas jalapenses. Cristalina, fria, mas não gelada, com uma correnteza que não deixa nem o mais intrépido dos nadadores do grupo vencerem-na. E olha que tentamos. Apostei uma cerveja com o Décio <span style="background-color: white;">que chegaria até a ponte, mas não fui capaz.</span></span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span>
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Os meninos fazem castelos de areia. A areia é fina, como as <span style="background-color: white;">mais</span><span style="background-color: white;"> </span><span style="background-color: white;">finas areias das praias costeiras. </span></span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Deixamos o Rio do Sono acordados, revigorados e prontos para mais kms de terra sob o sol.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span>
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">No meio do caminho, tem uma Catedral, e em frente a ela, o grupo fez a primeira foto coletiva. </span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td><a href="http://2.bp.blogspot.com/-Neq76TbZA6Q/UBAxIrPTt4I/AAAAAAAAG1Y/NIkXF4v5TJw/s1600/_CSC0143.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><img border="0" height="266" src="http://2.bp.blogspot.com/-Neq76TbZA6Q/UBAxIrPTt4I/AAAAAAAAG1Y/NIkXF4v5TJw/s400/_CSC0143.JPG" width="400" /></span></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="font-size: 12.8000001907349px;"><span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Na porta da igreja, ops, Serra da Catedral</span></td></tr>
</tbody></table>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Feitas as juras, seguimos para São Félix do Jalapão. </span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Calor escaldante, mas o almoço foi numa choupana bem sombreada, coberta por folhas de piaçava. Não a vassoura, mas uma palmeirinha anã que nasce feliz no cerrado.</span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Depois da refeição, fomos em busca de sorvete. Impossível saber as opções de sabor:</span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Eu (apontando para a geladeira onde um sem número de picolés de embalagens diferentes se espremem, um colado ao outro): </span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">- De palito, tem de que?</span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">A dona da sorveteria: </span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">- Picolé...</span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Aponto então para os potes de massa:</span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">- E de massa...?</span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">A dona da sorveteria:</span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">- É sorvete...</span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Desisto de escolher. Pego o primeiro que aparece. </span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">O ponto alto do dia é a Cachoeira da Formiga. Ali, em suas águas turquesas, os que ainda resistiam aos encantos do Jalapão, acabam por se entregar.</span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
</div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-lzQXXeO2MMc/UBA4zGUgseI/AAAAAAAAG2Y/MhoGGFjuZ5s/s1600/DSC05583.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="300" src="http://1.bp.blogspot.com/-lzQXXeO2MMc/UBA4zGUgseI/AAAAAAAAG2Y/MhoGGFjuZ5s/s400/DSC05583.JPG" width="400" /></a></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Deixamos a água bater forte nas costas, submergimos abaixo da correnteza, competimos para ver quem consegue ir e vir por baixo d'água, deixamo-nos arrastar pelas águas. </span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">O Jalapão nos envolve, nos refresca, nos diverte. </span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span></div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span></div>
Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-69273597036326350032015-05-05T13:51:00.001-07:002015-05-05T13:51:52.105-07:00Jalapaixão - 1ª parte<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://3.bp.blogspot.com/-HTn0tP0iZM0/UA8COSBS2RI/AAAAAAAAG0Y/tGlyDPMZYNs/s1600/IMG_0015.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="300" src="http://3.bp.blogspot.com/-HTn0tP0iZM0/UA8COSBS2RI/AAAAAAAAG0Y/tGlyDPMZYNs/s400/IMG_0015.jpg" width="400" /></a></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<br /></div>
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Há momentos que você sabe que está vivendo algo especial. Sabe que não irá esquecer. Que vai ter saudades e vontade de rebobinar a fita pra revivê-lo. Alguns são extremamente rápidos e delimitados: o nascimento de um filho, por exemplo. O instante em que, pela primeira vez, você olha dentro dos olhos daquele serzinho que já virou sua vida de ponta-cabeça. Ou o término de uma prova de Iron: o tapete azul, a visão do pórtico de chegada, o fim. Outras ocasiões, podem não ser tão bem delimitadas, mas também trazem uma carga de emoções profundas. O início de uma paixão ou, como foi nosso caso recentemente, uma viagem.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Estou ainda sob o impacto da experiência. Portanto, este não será um post imparcial, isento, objetivo. Pelo contrário, espero relatar a viagem com cores de paixão - as mesmas, por sinal, que tingem o céu do Jalapão ao entardecer.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span>
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Não é amor a primeira vista, já que ele não facilita as coisas para o visitante. Não se entrega, não se exibe, nem busca seduzir. É seco, bruto, agreste. O desavisado, ao aproximar-se, pode ficar com a primeira impressão e desistir de seguir em frente. Melhor assim. Não é para os fracos, nem para os frescos. </span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span>
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Lá fomos nós cinco: Ian, Félix e Martim - meus filhos, Roger - meu marido, e eu, numa expedição, com mais quinze aventureiros, seis guias e alguns acompanhantes, que lá estavam por razões diversas. Um grupo heterogêneo, vindo de diferentes partes do Brasil.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span>
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Os guias - Sergio, André, Paulinho, Galera, Kiko e Samir, não apenas cuidavam de nossa segurança, transporte, alimentação e acampamento mas, sobretudo, nos iniciaram nos segredos do Jalapão. Como aquele amante experiente, que conhece as curvas e os caprichos da mulher amada, foram nos levando para dentro do Jalapão. Ao mesmo tempo em que o Jalapão entrava dentro de nós.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span>
<table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: left; margin-right: 1em;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="http://4.bp.blogspot.com/-JNul0WvmuwU/UA8CYkzR0BI/AAAAAAAAG0g/uOVobHCTZv4/s1600/IMG_0023.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; margin-bottom: 1em; margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" height="240" src="http://4.bp.blogspot.com/-JNul0WvmuwU/UA8CYkzR0BI/AAAAAAAAG0g/uOVobHCTZv4/s320/IMG_0023.jpg" width="320" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="font-size: 12.8000001907349px; text-align: center;">O Mamute</td></tr>
</tbody></table>
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">O primeiro dia, é de muito chão. Instalados no Mamute - um caminhão de bombeiro alemão adaptado para esta nova função-, sacudimos no estradão de areia vermelha por várias horas, atravessando uma paisagem estranha aos nossos olhos. Horizontes sem fim, interrompidos pelas chamadas "serras": formações altas, que se destacam do chão, cujo topo é totalmente plano. Vemos uma revoada. Parecem beija-flores, mas são gafanhotos. De vez em quando, uma concentração maior de verdes, indica a presença de água: são as veredas, os oásis do cerrado.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span>
<br />
<table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: right; margin-left: 1em; text-align: right;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="http://4.bp.blogspot.com/-IZMb4IjPRuk/UA8DqZfJ-tI/AAAAAAAAG1M/Efxhjq1pmVA/s1600/DSC05391.JPG" imageanchor="1" style="clear: right; margin-bottom: 1em; margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" height="240" src="http://4.bp.blogspot.com/-IZMb4IjPRuk/UA8DqZfJ-tI/AAAAAAAAG1M/Efxhjq1pmVA/s320/DSC05391.JPG" width="320" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="font-size: 12.8000001907349px; text-align: center;">Nossas ocas, à sombra da mangueira</td></tr>
</tbody></table>
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Chegamos então ao local de nosso primeiro pouso. Uma fazenda. O acampamento é montado enquanto o almoço é servido. Tanto um, quanto outro, ficam à sombra de uma enorme mangueira. André e Kiko ensinam ao grupo como montar e desmontar as barracas. Logo em seguida à aula expositiva: aplicação prática. Meninos e homens trabalham na construção de seu lar provisório. Com a ajuda dos guias, que logo apareciam ao lado dos que estavam com dificuldades, a pequena vila foi instalada.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span>
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">Ao cair da tarde, rumamos para o primeiro atrativo oficial da viagem: Serra do Gorgulho. Para o deleite de meninos (e de meninos crescidos também), fomos autorizados a subir nas costas do Mamute. O trajeto, curto, foi feito de forma lenta e segura, para não haver riscos e para que curtíssemos a paisagem.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"><br /></span>
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;">O Gorgulho é uma formação de arenito, que irrompe do chão, vermelha e erodida. Dali do alto, com 360 graus de horizontes, vimos o sol descer e o céu ficar da cor da terra. Ali, o Jalapão segurou a minha mão, com doçura, mas com firmeza. E seu toque me agradou.</span><br />
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-1NnYHlT3tf4/UA8CxRWVtMI/AAAAAAAAG00/a2PdkN-ZLTQ/s1600/DSC05447.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="480" src="http://2.bp.blogspot.com/-1NnYHlT3tf4/UA8CxRWVtMI/AAAAAAAAG00/a2PdkN-ZLTQ/s640/DSC05447.JPG" width="640" /></a></div>
<br />
<span style="font-size: x-small;"><i>(A expedição Jalapão foi organizada pela <a href="http://www.venturas.com.br/" target="_blank">Venturas e Aventuras</a>)</i></span><br />
<div>
<span style="font-size: x-small;"><i><br /></i></span></div>
Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-10165330724615661902015-05-05T13:49:00.003-07:002015-05-05T13:49:51.641-07:00Rápida aventura<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><i>Este texto, escrevi sob encomenda há anos para uma publicação que nunca aconteceu. Como vocês perceberão, o narrador/protagonista não sou eu - é uma mistura de meus dois filhos mais velhos - Theo e Martim. Espero que gostem!</i></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Mãe, quero fazer uma corrida com você. Posso?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Fazia tempo que eu via minha mãe chegar suada e sorridente, com uma medalha pendurada no pescoço. Eram as tais provas. No começo, eu não entendia. Como assim, “prova”? Adulto também faz prova? E ainda por cima chega todo contente?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Logo saquei que eram competições de corrida o que ela chamava de provas. Fiquei impressionado porque sempre, sempre ela chegava com medalha. Ela devia ser super rápida. Ganhava todas! <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> —Todo mundo que termina a corrida, leva uma medalha, explicou.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> “Que coisa mais sem graça”, pensei. “Se todo mundo ganha, ninguém ganha, então não tem vencedores de verdade.”<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Pelo menos um domingo por mês ela saía bem cedinho de casa, de shorts, boné e camiseta e um número escrito num papel que ia preso por cima da roupa. Voltava perto da hora do almoço. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Aquilo começou a me intrigar. Devia ter alguma graça. Foi então que pedi pra ir com ela a uma corrida.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></span></b><b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O treinamento<o:p></o:p></span></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Antes de responder, ela coçou a cabeça e torceu a boca (ela sempre faz isso quando está em dúvida):<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Você quer correr? Tem certeza?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Balancei a cabeça com a maior firmeza. Já tenho dez anos. Quando tenho certeza, tenho certeza <i>mesmo</i>.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Bom... Primeiro, vou procurar uma corrida mais curta, de uns cinco ou seis quilômetros. Aí, você vai ter de treinar um pouco.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">“Cinco ou seis quilômetros é curta?! Treinar?” pensei, mas não deixei que ela percebesse meu susto. Eu imaginava que as corridas que ela fazia eram aquelas rapidinhas, tipo 100, <st1:metricconverter productid="200 metros" w:st="on">200 metros</st1:metricconverter>. E treinar? Para quê treinar? Correr é tão fácil! É só pegar e... Sair correndo! Não aguentei e disse:<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Mãe, eu já sei correr. Você acha que eu preciso mesmo treinar?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Ela deu uma risadinha.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Miguel, você vai precisar acostumar seu corpo a passar um tempo correndo sem parar. Não é igual a dar uma corridinha quando você está jogando bola. O que você acha que eu faço todos os dias cedinho, antes de vocês acordarem?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Era isso que ela chamava de <i>treino</i>. Nunca tinha me ligado.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Começamos o nosso no fim de semana. Viajamos para o interior e lá, como é mais tranquilo, saímos juntos por uma estradinha de terra.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Larguei <st1:personname productid="em disparada. Ela" w:st="on">em disparada. Ela</st1:personname> não acelerou. Veio vindo atrás de mim sem se importar em ser deixada pra trás. Eu olhava por cima do ombro e continuava rápido. Aos poucos, minhas pernas começaram a cansar. Não demorou para que ela me alcançasse. Minha respiração estava ofegante, meu coração parecia que ia sair pela boca, estava todo suado e não tinha mais força pra ir a lugar algum.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Então...já... deu... cinco... qui...lômetros...? perguntei, ainda tentando recuperar o fôlego.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Negativo. Não deu nem <i>um</i> quilômetro. Você vai ter de aprender a ir mais devagar.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Um quilômetro? Nem UM quilômetro? Ir mais devagar? Como eu vou ganhar se for mais devagar?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Ela riu.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Miguel, é isso mesmo. Mais devagar e você vai conseguir correr muito mais tempo.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Depois daquilo fizemos alguns outros treinos. Sempre que me lembrava, corria em volta de casa. Mas não sabia que distância conseguia percorrer, se havia chegado perto dos <st1:metricconverter productid="5 quilmetros" w:st="on">5 quilômetros</st1:metricconverter> ou quanto tempo tinha levado.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Então minha mãe me comunicou que havia feito minha inscrição na corrida. Seriam cinco quilômetros, na Cidade Universitária de São Paulo, a USP.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></span></b><b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O dia da corrida<o:p></o:p></span></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Minha mãe me tirou da cama antes de o sol nascer. Eu estava com muito sono. Tinha custado a dormir porque uma dúvida não saía da minha cabeça: “Será que vou conseguir terminar?”<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Vesti shorts, camiseta e um tênis de corrida que minha mãe me deu. Então ela tirou de uma sacola com o nome da corrida, o tal do número de papel e um pequeno objeto plástico e explicou:<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Este é o seu número de peito: 2044 e este, seu chip de cronometragem. Vou colocar em você.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Então ela prendeu com alfinetes o número na frente da minha camiseta e colocou o chip no cadarço do meu tênis. Enquanto ela fazia isso, perguntei:<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Para que serve isso, mãe?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— O chip marca o seu tempo. Quando a gente larga, passa por um tapete onde fica um sensor que lê a informação do seu chip e sabe que você é o número 2044 e se chama Miguel Navarro. No final, tem outra esteira que marca sua chegada. Depois sua classificação aparece no site da corrida. O número de peito é pra os organizadores saberem que você está competindo e te darem água, Gatorade e também para os fotógrafos tirarem fotos suas.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Classificação? Mas você não disse que todo mundo ganha medalha? Para que serve a classificação?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Serve pra você saber como foi seu tempo em relação aos outros.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Ah, então tem 1º, 2º e 3º colocados?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Tem, sim. Tem até do último que chega!<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">“Puxa...”, pensei “Será que o último não fica triste em ser o último de CINCO MIL pessoas?”<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Tomamos um café da manhã especial. Deixamos meu pai e meus irmãos dormindo e lá fomos nós.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Quanto mais perto chegávamos da USP, mais gente eu via vestida igual a mim e à minha mãe. Eram sete horas da manhã de um domingo e, aquelas pessoas, em vez de ficarem sossegadas dormindo nas suas caminhas quentinhas e confortáveis, andavam apressadas, mas sorridentes. Uma multidão uniformizada. Todos de um mesmo time.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></span></b><b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A largada<o:p></o:p></span></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Minha mãe conhecia um monte de gente. Me apresentava a todos:<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Este é Miguel, meu filho do meio. Ele vai correr comigo!<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">As pessoas arregalavam os olhos, me cumprimentavam e desejavam “boa sorte”. E eu só pensava “vou precisar mesmo!”. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Quanto mais próximos chegávamos da largada, mais gente tinha e mais borboletas pareciam voar dentro do meu estômago.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Num determinado ponto, minha mãe parou e disse:<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Vamos ficar por aqui se não, na hora que largar, vamos ser atropelados. Ah, espera aí que tenho uma coisa muito importante para você.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Então ela pegou uma espécie de cinto e colocou em volta do meu peito, debaixo da camiseta. Depois tirou o relógio de seu pulso e colocou no meu.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Isso é um monitor cardíaco e GPS. Além de cronometrar seu tempo e marcar sua velocidade, mostra quantas vezes por minuto o seu coração está batendo. Assim posso ver se você não está exagerando.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Adorei colocar aquele relógio. Ficou um pouco grande, é verdade. Mas era muito legal ver como meu coração batia e, mais ainda, eu iria poder ver a minha velocidade!<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Agora vamos combinar a estratégia para a prova.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Estratégia? Não é só correr do começo ao fim?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Sim, a gente vai correr do começo ao fim. Mas vamos tentar fazer o seguinte: no primeiro quilometro a gente vai bem leve, no segundo, a gente acelera um pouquinho, no terceiro a gente acelera um pouco mais e daí mantém até chegar no último. No último, se você estiver bem, aí pode socar a bota!<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Socar a bota?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Ir o mais rápido que der, como naquele seu primeiro treino.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Tinha uma coisa que estava me incomodando. Eu precisava perguntar.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Mãe... e seu eu não... e se eu não aguentar chegar até o fim? Você vai ficar muito decepcionada comigo?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Ela me olhou muito séria:<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Filho, não tem o menor problema se você não conseguir. Mas tenho certeza de que você vai cruzar a linha de chegada. Se você se cansar, a gente anda um pouco.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Mas <i>pode</i> andar?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Pode, pode sim. Fica tranqüilo. Não só você vai terminar, como vai chegar antes de um monte de gente.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Fiquei um pouco mais sossegado. Eu não queria andar. Muito menos ser o último!<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Ela pegou a minha mão e apertou forte. Olhou-me e disse:<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Boa prova, filho!<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Boa prova, mãe! — respondi.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Soou a largada. Um som de berrante. As pessoas festejaram gritando e batendo palmas e saíram caminhando sem muita pressa.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></span></b><b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Quilômetro 1<o:p></o:p></span></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Ao passarmos pelo pórtico da largada, minha mãe disparou o cronômetro do relógio de pulso. Ali, todos começavam a correr.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Mesmo que quiséssemos, não conseguiríamos ir muito rápido. Era um mar de gente.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Alguns mais apressados tentavam costurar entre as pessoas, como motoristas nervosos numa estrada cheia. Mas pelo menos pediam licença.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Nós íamos num trotinho que não me cansava.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Depois de sete minutos avistei uma placa onde se lia: <st1:metricconverter productid="1 km" w:st="on">1 km</st1:metricconverter>. Já tínhamos traçado o primeiro quilômetro!<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></span></b><b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Quilômetro 2<o:p></o:p></span></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Com um “give me five” comemoramos a passagem pela placa. Minha mãe conferiu como estava meu coração e, como tínhamos combinado, aceleramos um pouquinho.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Achei que iria ficar sem fôlego, mas, depois de alguns metros, minha respiração se acostumou com aquele ritmo.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Nesse momento as borboletas voaram embora do meu estômago. Comecei a olhar em volta e ver que tinha todo o tipo de gente correndo: homens, mulheres, magrelos, gorduchos, altos, baixos, velhos, moços (mas eu era o caçula ali, com certeza), rápidos, lentos. Alguns conversavam com corredores ao lado, outros iam solitários ouvindo música e, uns poucos, em vez de correr, caminhavam rápido. Mas não tinha um que não estivesse levando a sério aquela corrida.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Olhei para o meu relógio. Estávamos a <st1:metricconverter productid="9,7 km" w:st="on">9,7 km</st1:metricconverter> por hora quando passamos pela placa de <st1:metricconverter productid="2 km" w:st="on">2 km</st1:metricconverter>.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></span></b><b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Quilômetro 3<o:p></o:p></span></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Neste quilômetro me animei e comecei a acelerar muito. Minha mãe disse:<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Calma aí! Vamos mais rápido, mas nem tanto. Olha, tenho uma idéia. Está vendo aquele cara ali na frente de boné azul? Vamos ultrapassá-lo! Mas sem correria!<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Então miramos no boné azul e lá fomos nós. Conseguimos passar. Minha mãe propôs novamente:<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Agora aquela moça de rabo de cavalo e shorts preto. Vamos?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Depois foi minha vez de sugerir um casal que estava de camiseta igual.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E assim fomos, ganhando de um monte de gente. As pessoas nem percebiam o que a gente estava fazendo, mas, para mim, cada uma dessas ultrapassagens era uma pequena vitória.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">No meio deste quilômetro havia um posto de hidratação.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Quando peguei a água de uma das moças que estendia o copinho pros corredores que passavam, ela olhou pra mim e disse para os outros:<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Olha só, gente! Um garoto!<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Aêêê! Parabéns! Vai lá, rapaz, você está muito bem!<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E todos bateram palmas enquanto eu tentava manter a corrida e beber água ao mesmo tempo – o que não era muito fácil.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Chegamos à placa de 3km. Comemoramos de novo com um “give me five”. Minha mãe disse:<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Já foi mais da metade. Agora falta pouco!<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O relógio marcava <st1:metricconverter productid="10,1 km" w:st="on">10,1 km</st1:metricconverter> por hora.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></span></b><b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Quilômetro 4<o:p></o:p></span></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Nesta parte do percurso os corredores estavam bem mais espalhados e havia espaço para correr. Mas também apareceu uma coisa que não estava no programa: uma subida.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Minha mãe deu as instruções:<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— É uma subida pequena, mas é uma subida. Vamos diminuir um pouco o ritmo e vamos dividir em pequenos pedaços.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Como assim?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Está vendo aquele poste? Pense que a subida é só até ali.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Quando chegamos ao poste, que era bem pertinho, ela disse:<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Muito bom! Agora, aquela caçamba de lixo!<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E lá fomos nós. Cada trechinho tinha uns dez metros e comemorávamos cada chegada.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Quando chegamos ao topo, ela disse:<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Agora pode soltar o freio, que é só descida!<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Que delícia! Aceleramos e chegamos até mais um posto de hidratação. Peguei um copinho, tomei um gole, sem parar de correr e, imitando minha mãe, joguei um pouquinho na cabeça pra refrescar.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Aumentei minha velocidade. O relógio marcava 10,6 quilômetros por hora.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Ainda falta um quilômetro e meio - disse minha mãe, - você está bem mesmo? Então vamos assim, neste ritmo mais forte.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Começamos a ultrapassar várias pessoas. Muitas exclamavam:<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Olha só esse garoto! Ta mandando bem, hein? Parabéns!<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Comecei a me sentir cada vez melhor, embora já tivesse corrido quase quatro quilômetros. Nem parecia. “Queria que meu pai e meus irmãos vissem isso...” pensei “Eles se orgulhariam de mim!” Na hora em que pensava isso, vi a placa do km 4.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></span></b><b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O último quilômetro<o:p></o:p></span></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Era hora do tudo ou nada. O olhar da minha mãe me disse: “Vamos nessa!”<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E fomos com tudo.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Minhas pernas me levavam. Meus braços abriam o espaço que estava à nossa frente, meu coração pulsava rápido, minha respiração martelava junto com a batida dos meus pés no chão, minha cabeça estava vazia. Eu não via, mas percebia a presença de minha mãe ali ao lado.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Então avistei o pórtico de chegada.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></span></b><b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A chegada<o:p></o:p></span></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Um pouco antes de cruzarmos a linha de chegada a pista se estreitava, formando uma espécie de funil. Ali, ficava a torcida, aplaudindo todos que chegavam.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Quando entramos neste funil as pessoas aplaudiram muito, assobiaram, gritaram. Tive até a impressão de ouvir meu nome, mas eu não conseguia olhar para os lados — estava totalmente concentrado em chegar ao fim. Minha mãe segurou minha mão para passarmos o pórtico.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Uma alegria imensa tomou conta do meu corpo. E me senti forte como nunca tinha me sentido na vida.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Atravessamos a linha de chegada juntos. Então me soltei de minha mãe e ainda tive forças pra saltar e dar um soco no ar gritando “Yessssss!”<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Minha mãe me abraçou forte. Seus olhos estavam molhados. Voltei a enxergar e ouvir o que estava à nossa volta.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">— Mamãe! Miguel! Mamãe! Miguel! Aqui! Aqui!<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Meu pai e meus três irmãos estavam lá e faziam a maior gritaria. Corremos até eles e fizemos a maior festa. Mas eles estavam de um lado da grade, e nós, do outro.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Para sair dali era preciso devolver o chip e... Pegar a medalha!<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Tirei o chip e ganhei a medalha mais linda do mundo.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Ganhamos também uma camiseta de “finisher” (só pra quem termina a prova) e um lanchinho.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></span></b><b><span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O último colocado<o:p></o:p></span></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Saímos da confusão e encontramos a família. Como o dia estava bonito e meu pai achava que se saíssemos àquela hora pegaríamos muito trânsito, ficamos por ali mesmo, conversando. Eu queria contar tudo para os meus irmãos!<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O tempo foi passando, o número de pessoas diminuindo e os corredores iam chegando aos poucos. Até uma hora que parecia não haver mais ninguém. Os organizadores começavam a se movimentar para desmontar as grades, tirar os tapetes... Mas havia uma família ali. Uma mulher mais velha, dois casais de adultos e algumas crianças que brincavam por perto.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A senhora mais idosa parecia tentar enxergar ao longe, as outras, mais moças, roíam as unhas e torciam as mãos. Mas aí ele apareceu. O último colocado. Ele vinha correndo num ritmo arrastado, quase parando. Então ele viu sua família. Seu peito se encheu de ar, seu passo ganhou firmeza, ele acelerou e veio com suas últimas forças. A família gritava “Vai vovô! Vai papai!”. Então pularam a grade e encontraram com seu campeão bem na linha de chegada.<o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="line-height: 18.3999996185303px; text-align: justify; text-indent: 36pt;">
</div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="-webkit-text-stroke-width: 0px; color: black; font-family: 'Times New Roman'; font-size: medium; font-style: normal; font-variant: normal; font-weight: normal; letter-spacing: normal; line-height: 18.3999996185303px; orphans: auto; text-align: justify; text-indent: 36pt; text-transform: none; white-space: normal; widows: 1; word-spacing: 0px;">
<div style="margin: 0px;">
<span style="font-size: 11pt; line-height: 16.8666667938232px;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">“Ele chegou em último lugar, eu não cheguei em primeiro” pensei, “mas acho que nós dois somos campeões!”. E foi aí que entendi o valor daquelas medalhas.<o:p></o:p></span></span></div>
</div>
Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-57061936640052948622015-05-05T13:47:00.002-07:002015-05-05T13:47:47.413-07:00Garanta Vermelha - minha nórdica paixão<div style="border: 0px; font-size: 14px; line-height: 1.428571em; margin: 0px; padding: 0px;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Encontrei o norueguês Jo Nesbø porque procurava. Navegava pela internet em busca de um novo romance. </span><span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif; line-height: 1.428571em;">De preferência, nórdico. </span><span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif; line-height: 1.428571em;">Policial. Depois de ler a trilogia </span><b style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif; line-height: 1.428571em;">Millenium</b><span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif; line-height: 1.428571em;"> (Stieg Larsson) e o </span><b style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif; line-height: 1.428571em;">Homem de Beijing </b><span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif; line-height: 1.428571em;">(Henning Mankell) não queria outra coisa.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A combinação de uma trama bem montada com personagens densos na paisagem gelada da Escandinávia me enfeitiçou. E, assim, por acaso, topei com <strong style="line-height: 1.428571em;">Garganta Vermelha</strong>. <br clear="none" />Bastou ler três páginas para não conseguir mais fazer outra coisa da vida. Sorte minha, que estava de licença médica em casa. Azar meu. Mal sabia o grau de dependência que iria me acometer.<br clear="none" /><strong style="line-height: 1.428571em;">Garganta Vermelha</strong> não é um livro para iniciantes. A história se desenrola em duas épocas diferentes: atual e durante a 2ª Guerra. Além disso, o ângulo da narrativa transita entre alguns personagens. É como se o leitor estivesse olhando por um caleidoscópio. Aos poucos, entretanto, as imagens vão se conectando e o sentido aparecendo. Em alguns momentos, até o mais experiente dos leitores vai duvidar de seu entendimento e ter de voltar algumas páginas pra checar se não está se confundindo.<br clear="none" />A tensão e o suspense, típicos dos filmes e romances policiais, são crescentes do começo ao fim mas também aparecem em cenas, ops, capítulos, ao longo do livro.<br clear="none" />O que realmente me ganhou foi o herói. Ou o anti-herói. Harry Hole é um policial atormentado por seus fantasmas. Como muito dos detetives americanos da década de 50, é um renegado. Antissocial, alcoólatra, fumante, encrenqueiro, insubordinado, impulsivo, obsessivo-compulsivo. Mas, como eles também, é brilhante, irônico e enxerga além das aparências. E tem mais. É leal, passional, corajoso e tem um tremendo senso de justiça. Magro, alto (1,92 pra ser exata), olhos azuis, cabelos raspados e, a cada aventura, ganha novas cicatrizes tenebrosas, que não conseguem enfeiá-lo. É um pouco atrapalhado com as mulheres. Ainda assim, não deixa de conquistar corações entre um assassinato e outro.</span></div>
<div style="border: 0px; font-size: 14px; line-height: 1.428571em; margin: 0px; padding: 0px;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Além disso, nem sempre os piores vilões são os assassinos. Isso cria, na história, enredos paralelos - que às vezes levam dois, três até quatro volumes para o desenlace!</span></div>
<div style="border: 0px; font-size: 14px; line-height: 1.428571em; margin: 0px; padding: 0px;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Os coadjuvantes, que aparecem mais em alguns livros do que os outros, também tornam-se nossos velhos amigos. Como Harry, são também um pouco desajustados: nerds, bipolares, alcoolatras...humanos.</span></div>
<div style="border: 0px; font-size: 14px; line-height: 1.428571em; margin: 0px; padding: 0px;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></div>
<table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: right; margin-left: 1em; text-align: right;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="http://2.bp.blogspot.com/-tP62CtHEeeY/UpEkVnyh2YI/AAAAAAAAHOA/-AY6fdvtNYg/s1600/JN%C2%A9Cato_Lein_5.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; margin-bottom: 1em; margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" height="266" src="http://2.bp.blogspot.com/-tP62CtHEeeY/UpEkVnyh2YI/AAAAAAAAHOA/-AY6fdvtNYg/s320/JN%C2%A9Cato_Lein_5.jpg" width="320" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="font-size: 12.8000001907349px; text-align: center;">Foto de Cato Lein - site oficial Jo Nesbo</td></tr>
</tbody></table>
<div style="border: 0px; font-size: 14px; line-height: 1.428571em; margin: 0px; padding: 0px;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O autor tem uma trajetória curiosa. Filho de bibliotecária e professor, gostava de ler, mas era péssimo aluno. Sonhava em jogar no Totenham, então começou pelo Molde FC e só parou porque teve problemas no joelho.</span></div>
<div style="border: 0px; font-size: 14px; line-height: 1.428571em; margin: 0px; padding: 0px;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Recuperou o tempo perdido, cursou economia e foi trabalhar no mercado financeiro. De dia. À noite cantava numa banda pop - Di Derre. Gravaram discos, fizeram turnês e alcançaram um relativo sucesso. Nesbo era o letrista.</span></div>
<div style="border: 0px; font-size: 14px; line-height: 1.428571em; margin: 0px; padding: 0px;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A vida dupla era muito puxada. E ele também sentia que seu perfil não era adequado para orientar investidores. Sincero demais. Cansou. Largou a banda, o emprego e foi fazer um sabático na Austrália. Uma amiga, editora, sugeriu que ele escrevesse um livro sobre a sua experiência na banda. Mas ele voltou com Harry Hole.</span></div>
<div style="border: 0px; font-size: 14px; line-height: 1.428571em; margin: 0px; padding: 0px;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Depois de <strong style="line-height: 1.428571em;">Garganta Vermelha</strong>, persegui Jo Nesbo incansavelmente. No Brasil, ele tem publicado pela Record, <strong style="line-height: 1.428571em;">A Casa da Dor</strong>, <strong style="line-height: 1.428571em;">A Estrela do Diabo </strong> e <strong style="line-height: 1.428571em;">O Redentor</strong>. Na FNAC encontrei e/ou encomendei, em inglês, <strong style="line-height: 1.428571em;">The Snowman</strong>, <strong style="line-height: 1.428571em;">The Leopard, Phantom, The Bat </strong> e, o único que não é com Harry Hole, <strong style="line-height: 1.428571em;">Headhunters</strong>.</span></div>
<div style="border: 0px; font-size: 14px; line-height: 1.428571em; margin: 0px; padding: 0px;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><strong style="line-height: 1.428571em;">The Bat</strong> é o primeiro mas foi publicado em inglês somente depois que ele se consagrou como escritor. Não é sofisticado como o terceiro (<b>Garganta Vermelha</b>), mas vale a leitura, principalmente porque é onde nasce o personagem. E dá pra perceber a evolução de Nesbo como autor. O segundo, <strong style="line-height: 1.428571em;">The Cockroaches</strong>, é o único que ainda não consegui comprar. </span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-YDWZnb1PyUU/UpEiwZa1wfI/AAAAAAAAHNw/pI-lsBG7oS8/s1600/background_landingpage_police2.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="320" src="http://4.bp.blogspot.com/-YDWZnb1PyUU/UpEiwZa1wfI/AAAAAAAAHNw/pI-lsBG7oS8/s320/background_landingpage_police2.png" width="208" /></a></div>
<div style="border: 0px; font-size: 14px; line-height: 1.428571em; margin: 0px; padding: 0px;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Em 13 de outubro passado ele lançou <strong style="line-height: 1.428571em;">Police</strong>. No dia seguinte, encomendei pela Amazon. Demorou um mês pra chegar, mas valeu a pena. Tentei economizar. Ler poucas páginas ao dia. Impossível. O livro ficou grudado em minhas mãos e, enquanto não terminei, minhas horas de sono ficaram ainda mais reduzidas. </span></div>
<div style="border: 0px; font-size: 14px; line-height: 1.428571em; margin: 0px; padding: 0px;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Que me desculpem os que consideram a literatura policial um gênero menor. Discordo frontalmente. E usarei todas as armas que forem necessárias pra defender meu ponto de vista: de uma Glock 9mm a uma Leopold's Apple (vide <b>The Leopard</b>). </span></div>
<div style="border: 0px; font-size: 14px; line-height: 1.428571em; margin: 0px; padding: 0px;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Um bom romance policial tem tudo de melhor que há na literatura - trama interessante - com o plus das reviravoltas -, personagens redondos, pitadas de humor e, muitas vezes, um discurso bem construído.<br clear="none" />Então, em vez de finalizar meus estudos pra prova de Estratégia de Empresa, eis-me aqui redigindo uma ode de amor ao Jo Nesbo e ao Harry Hole. Como eles, também não sou uma personagem linear ou plana. Deve ser por isso. E, bom... nem preciso finalizar dizendo o quanto recomendo a leitura.<table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: right; margin-left: 1em; text-align: right;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="http://3.bp.blogspot.com/-mUkOMxrwkGQ/VUksNr5M9aI/AAAAAAAAJHY/hCsdF_01jSc/s1600/jonesbo.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; margin-bottom: 1em; margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" height="240" src="http://3.bp.blogspot.com/-mUkOMxrwkGQ/VUksNr5M9aI/AAAAAAAAJHY/hCsdF_01jSc/s320/jonesbo.jpg" width="320" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Minha nórdica paixão e eu.</td></tr>
</tbody></table>
</span></div>
Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-34156308986436359702015-05-05T13:42:00.002-07:002016-05-20T12:56:14.079-07:00Visto<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-u3D1c5fLOyc/VUkrGvjiaKI/AAAAAAAAJHM/gKeqtOHIxWk/s1600/visto.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="320" src="https://4.bp.blogspot.com/-u3D1c5fLOyc/VUkrGvjiaKI/AAAAAAAAJHM/gKeqtOHIxWk/s320/visto.jpg" width="240" /></a></div>
Estava na "fila da segurança" para entrar no consulado americano. Era a terceira das seis filas necessárias para passar pela entrevista. Antes mesmo de entrar no prédio, você é abordado de forma educada, mas não simpática, e é convocado a mostrar seus pertences. Melhor dizendo, a comprovar que entre os seus pertences não há nenhum aparelho eletrônico ou bomba. Quase fui reprovada na revista. O moço perguntou se eu trazia comigo celular, tablet ou carregador de bateria. Neguei veementemente. Então ele sacou de dentro da minha bolsa um pen drive: <br />- O que é isso?!<br />- Um pen drive... - respondi baixinho, imaginando de onde poderiam surgir os homens de preto que me levariam dali.<br />Mas ele apenas grunhiu "humpf", devolveu o dispositivo para dentro da bolsa e me mandou seguir para a segunda fila. Não era ainda a fila da segurança. Era a fila amarela.<br />Então, na terceira fila, a da segurança, apareceu um moço que realmente devia ser AQUELE.<br />- Eu já falei, eu já avisei... Tem que chegar aqui na porta SEM o cinto! Vocês deixam pra tirar o cinto quando chegam aqui! Atrapalham tudo! A fila não anda, por causa de vocês que deixam pra tirar o cinto aqui na frente, mas vocês não escutam, vocês não escutam! Eu JÁ falei - NÃO ENTRA DE CINTO! Por que vocês não tiram o cinto antes? Estão aí sem fazer nada! E olha, aparelho eletrônico NÃO ENTRA! Querem chegar até aqui e depois voltar pro começo da fila? Azar de vocês! Porque não vai entrar. NÃO vai. Já tiraram o cinto? Já tiraram? Vocês não me ouvem, não prestam atenção! Eu já avisei laaaaa atrás. Tem que tirar o cinto. NÃO ENTRA de cinto. Nem de celular! Estão entendendo? <br />O menininho atrás de mim deve ter passado a acreditar na história dos pais sobre não poder ir pra Disney porque ficou quietinho. <br />Comecei a ficar com medo de que o moço que tinha me deixado entrar com o pen drive não tivesse sido rigoroso o suficiente. Ele deveria ter me proibido de seguir adiante com o pen drive. Afinal, um pen drive não é um aparelho eletrônico? Tem saída USB!<br />Pronto. Ali dentro, as portas que o guardinha zelava com tanto fervor, seriam fechadas para mim. Sabe-se lá quando conseguiria voltar. O melhor seria me livrar daquele pen drive. Pensei em deixá-lo cair discretamente em algum lixo. Mas eles não iriam dar essa moleza. Um lixo é um ótimo lugar para se esconder uma bomba. Não havia nenhum por ali. Então cogitei atirar pra longe, pra rua, através das grades. Mas, eles poderiam achar que eu estava jogando algum tipo de explosivo. Não havia saída. Nem para mim, nem pro pen drive.<br />Chegou minha vez. A bolsa foi para o raio x. Esperei. A bolsa da mãe do menininho, também. O operador da esteira perguntou se a minha bolsa era minha e passou pela raio x mais uma vez. Meu coração disparou. Passou a da mãe também. Então me disse: <br />- Pode ir.<br />Dirigiu-se para a minha parceira de fila:<br />- A senhora ainda não. Está sozinha?<br />- Com meu marido e meu filho - ela respondeu, empalidecendo.<br />Não pude ficar para saber o que aconteceu. Avisei o marido:<br />- Seguraram sua esposa.<br />E segui em frente, em busca da nova fila, antes que alguém mudasse de ideia e me chamasse de volta achando que eu era cúmplice da família terrorista. <br />Por essa passei rápido e quase sem sofrimento. Quem estava sofrendo mesmo era um pequenino de uns três anos que, além de ter de aturar aquela situação estranha e desconfortável, ainda tinha de ouvir dos pais "ah, se você não se comportar, AQUELE moço não vai deixar você ir pra Disney!".<br />Com uniforme de guardinha, andava de um lado pro outro, encarando um a um, os pobres mortais que aguardávamos para sermos aceitos no Olimpo, discursando:<br />Daquele momento em diante, não vi mais os três. Não soube o que aconteceu.<br />Certamente a mãe deveria ter na sua bolsa algo perigoso como uma fralda, uma chupeta ou mamadeira. Bem pior que o meu pen drive.Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-14836580809783461832015-05-05T13:28:00.000-07:002015-05-05T13:28:26.254-07:00Aos formandos do nono ano<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Tive
a honra de representar a Comissao Pv Nonoano na
formatura da turma de meu filho Martim. A pedido de <st1:personname w:st="on">Katia</st1:personname> Giustino e Jane Maranhão, escrevi e li um
texto que deveria ser um recado ao formandos e um agradecimento à escola. (Na
foto estou tentando colocar o microfone de volta ao lugar). Aí vai o texto
lido:<o:p></o:p></span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-jzilkIGglXg/VUknYdHiRvI/AAAAAAAAJG4/OT9FbRawXOs/s1600/formatura.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="240" src="http://2.bp.blogspot.com/-jzilkIGglXg/VUknYdHiRvI/AAAAAAAAJG4/OT9FbRawXOs/s320/formatura.jpg" width="320" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Filhos,
filhas queridos e amados<br />
A gente poderia começar esta conversa falando da importância deste momento: a
etapa vencida, as grandes conquistas, o ciclo fundamental que se encerra, o
crescimento e o amadurecimento de vocês;<br />
E a gente poderia também falar daquilo que fica pra trás: as brincadeiras, a
infância, a inocência, a dependência tão forte dos pais...<br />
Em vez disso, escolhemos falar do que estão levando com vocês ao deixar a
Projeto. Daquilo que levarão não apenas para o Ensino Médio, mas para a vida.<br />
Sem dúvida, parte do que levarão é uma base sólida com fundamentos da
matemática, princípios das ciências, pilares da geografia, marcos da
história...E também levarão as notas, boletins – o chamado “histórico escolar”.
Mas... Será isso o mais importante? Será que esta é a bagagem mais
significativa que vocês estão levando da Projeto para a Vida?<br />
Duvido.<br />
O cabedal acadêmico, as matérias, o currículo, os boletins escolares e suas
notas contam, pois abrem portas, ampliam os horizontes e facilitarão o percurso
escolar e profissional que vocês terão pela frente.<br />
Mas este conhecimento todo poderia ser apenas um amontoado de conceitos,
ideias, fatos e datas sem sentido. E muitas vezes, é. Porque o que a gente não
encontra em qualquer esquina, nem em qualquer escola, é o caldo em que este
conhecimento vem embebido. O que a gente não vê em qualquer lugar é como este
conhecimento todo – com seu caldo – é absorvido e saboreado pelos alunos.<br />
Na Projeto, este caldo é temperado por valores cuidadosamente escolhidos. Os
alunos, com seus professores e a equipe, puderam aprender sentindo o gosto
destes valores. Descobriram que o conhecimento não é incolor, inodoro e
insípido (como aprendíamos sobre a água antigamente...). O conhecimento é
pulsante, multicolorido, plurifacetado, parcial, desafiante mutante...
provisório! Esta consciência vocês levarão da Projeto para a vida.<br />
Também, acreditamos, vocês levam na bagagem o entendimento de que este caldo
não se prepara e nem se toma sozinho. “Aprender” é um verbo que raramente
deveria ser conjugado na primeira pessoa do singular. Em vez de tantos “eu
aprendo”, mais “nós aprendemos”. E aprendemos preparando o caldo juntos, na
cozinha, conversando, enquanto picamos o alho, descascamos a cebola, provamos o
sal, dosamos a pimenta, sob a batuta de um chef experiente, a equipe da
escola.<br />
Junto com a receita do caldo estão os parceiros desta animada experiência: os
amigos.<br />
Não é à toa que se diz “fazer amigos”. Porque “amizade não se compra”, amigo
não tem pra vender no supermercado. A gente tem de fazer. E quando a gente faz
amigos, os amigos fazem a gente. Amigos fazem a gente rir. Rir da gente mesmo,
das situações e de qualquer bobagem. Amigos fazem a gente se emocionar – de
alegria, de raiva, de compaixão.<br />
Amigos nos fazem crescer – porque nos aceitam, mas também porque nos provocam.
Amigos nos fazem melhores. E é na escola que podemos fazer os melhores amigos –
um presente que levarão – claro, porque tiveram a sorte de estar num lugar que
cuidou para que não se estabelecessem desigualdades, discriminações e
isolamento. Mas incentivou a cumplicidade, a lealdade, a tolerância.<br />
Nestes anos de Projeto pudemos ver as amizades brotando, crescendo, enraizando
fortes. Como é natural, vocês estreitaram os laços com uns mais do que com
outros, mas o que pudemos testemunhar nas festas, apresentações, no teatro e em
outras ocasiões é que vocês se tornaram um grupo que transformou as diferenças
entre vocês numa teia flexível e resistente que une cada um a todos os outros.
Um emaranhado colorido de personalidades que se identificam como grupo, mas que
se afirmam como únicos.<br />
Nós, pais, só podemos agradecer à escola, por ter – mais do que possibilitado –
investido na construção destes vínculos. Tornado o dom da amizade parte de seu
projeto.<br />
Além deste dom, das ferramentas e conhecimentos sobre os quais falei,
acreditamos que vocês levam consigo mais umas tantas preciosidades<br />
ALEGRIA, CULTURA, ÉTICA, LIBERDADE, AUTONOMIA, PERGUNTAS, COMPROMISSO,
COMPANHEIRISMO, RESPEITO, CURIOSIDADE, DIÁLOGO, FELICIDADE, INICIATIVA,
GRATIDÃO, SAUDADES, CONVICÇÕES, UNIÃO...<br />
Temos certeza de que vocês vão dar conta do recado - mesmo que às vezes possam
achar que não.<br />
Com essa bagagem, ao lado destes amigos, vocês estão prontos para escalar a
próxima montanha, e a que vier depois dessa, e a outra e a outra.<br />
E estaremos sempre aqui, atentos. Não só pra estender a mão, oferecer um ombro
ou acomodá-los em nossos colos. Estaremos aqui, principalmente, para lembrá-los
de que sim, vocês podem, vocês podem ser tudo o que sonharem.<o:p></o:p></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;"><br />
<o:p></o:p></span></div>
Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-80621128297017048292015-05-05T13:26:00.002-07:002015-05-05T13:26:44.642-07:00Coisas estranhas<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-LTH1V2VRcTk/VUknaKPiAOI/AAAAAAAAJHA/BTe2w_eXGPc/s1600/coisasestranhas.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" height="300" src="http://4.bp.blogspot.com/-LTH1V2VRcTk/VUknaKPiAOI/AAAAAAAAJHA/BTe2w_eXGPc/s400/coisasestranhas.jpg" width="400" /></a><span style="font-family: Georgia;">Na
minha casa acontecem coisas estranhas.<br />
Sapatos andam sozinhos. No caminho, largam as meias. Casacos saem do armário
para passear e costumam postar-se no sofá em frente à TV . As toalhas banham-se
e vão tirar um cochilo sobre os lençóis da cama.<br />
Mochilas pulam para o chão e vomitam seu conteúdo.<br />
O telefone sem fio se esconde.<br />
As pastas de dentem se abrem. Xampus transbordam. Papel higiênico gira e se
desenrola até encostar-se ao chão.<br />
A s garrafas de água (as duas!) esvaziam-se sem que ninguém beba.<br />
Copos, potes, pratinhos espalham-se pela casa, ligeiramente sujos.<br />
Bananas descascam-se e puf! Desaparecem no ar sem deixar vestígios – ou melhor,
deixando. Uvas fogem da geladeira e abandonam seus cachos gelando.<br />
As luzes se acendem. As portas se destrancam.<br />
De vez em quando, uma louça se suicida. De repente, todas, todas as canetas
decidem fugir sem ao menos escrever um bilhete.<br />
Coisas estranhas acontecem na minha casa. Será só na</span><span style="font-family: "Trebuchet MS"; font-size: 11.0pt; line-height: 150%;"> minha?<o:p></o:p></span></div>
Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-4342423279694005552015-05-05T13:14:00.004-07:002015-05-05T13:14:35.860-07:00SOS Sumaca<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">SOS
SUMACA<br />
O Parque Zilda Natel – carinhosamente apelidado de Sumaca por seus
frequentadores, sempre foi um exemplo de espaço público na melhor acepção: um
lugar de todos, para todos. Era um terreno baldio, abandonado desde a
construção da estação Sumaré, que graças à brilhante ideia de Stela Goldenstein e
sua equipe da Secretaria de Meio Ambiente do município, foi transformado numa
área de lazer para crianças, jovens e adultos no começo de 2009.<br />
A maior parte é ocupada por três pistas de skate: uma street, com rampas e
corrimãos; um bowl e um half pipe. O projeto das pistas teve participação de
membros da Confederação Brasileira de Skate. Mas não é só de skate que vive a
Sumaca. Há também uma quadra de streetball, aparelhos de ginástica, mesas com
tabuleiros pintados. Conta também com uma pequena arquibancada, bancos,
bebedouros e banheiros.<br />
Durante bastante tempo acompanhei meus filhos ali e sempre achei um dos locais
mais democráticos que já frequentei. Crianças grandes, médias e pequenas, com
seus pais, dividiam os diferentes espaços com jovens, adultos e até idosos.
Pobres, ricos e remediados; branquinhos loirinhos de tênis novos e reluzentes
aprendiam novas manobras com morenos, rastas ou com outros loirinhos, de tênis
emendados com silver tape. E vice-versa. Veteranos do skate aguardavam
pacientemente enquanto meninos recém-saídos das fraldas desciam as rampas de
mãos dadas com seus pais ou mães. Na aparente confusão das pistas sempre houve
um convívio pacifico, respeito, solidariedade, tolerância. Muitas amizades
nasceram ali.<br />
O uso do capacete era obrigatório (para minha tranquilidade) e, no início, até
havia capacetes disponíveis para empréstimo. As regras, como esta do uso de
capacetes e da proibição de animais, por exemplo, estavam afixadas de modo
visível.<br />
Havia uma empresa de segurança tercerizada abria e fechava o parque, zelava
pela segurança e tinha um ótimo relacionamento com os frequentadores. O cuidado
era compartilhado. Quando a pista começava a ficar com defeitos, alguns
skatistas se organizavam para fazer reparos. Quando chovia, eles ajudavam com
rodos a empurrar a água pra fora da pista. A parceria entre os frequentadores e
os guardas, salvo uma ou outra desonrosa exceção, funcionava bem.<br />
Não havia drogas. Nunca houve assaltos.<br />
Mas de um tempo pra cá, a Sumaca está sendo abandonada. O contrato com a
empresa de vigilância terminou e não foi feito outro. Não há segurança. Já
aconteceu um assalto. A iluminação (que a bem da verdade nunca foi um primor)
precisa de uma urgente troca de lâmpadas, prometida há meses. De vez em quando,
alguém acende um baseado e, embora seja repreendido pelos próprios
frequentadores, este clima inseguro afasta o público mais família que acaba
tornando o clima ainda mais inseguro. E ninguém mais se importa com os
capacetes.<br />
Foi criado um conselho gestor que tem brigado para que o poder público cumpra
sua parte: pela poda das árvores que encobrem a iluminação, pelo material para
manutenção da pista (que eles, skatistas, fazem) e até pela água que tem
faltado nos bebedouros. Os esforços são imensos e os resultados, quando
aparecem, demoram. Eles precisam ser ouvidos, eles precisam de apoio.<br />
Como cidadã, vou fazer tudo que estiver ao meu alcance. Além de participar da
reunião do conselho vou também botar a boca no trombone. Começo por aqui. E
conto com a ajuda de todos – skatistas, pais de skatistas ou cidadãos – para
garantir que um espaço como o da Sumaca, que ensina na prática o que é
cidadania, seja cuidado como ele merece.</span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-tFEU0mTDot4/VUkklVSsgiI/AAAAAAAAJGs/4YnptafUIHw/s1600/sossumaca.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="320" src="http://1.bp.blogspot.com/-tFEU0mTDot4/VUkklVSsgiI/AAAAAAAAJGs/4YnptafUIHw/s320/sossumaca.jpg" width="320" /></a></div>
<o:p></o:p>Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-48418397017352915572015-05-05T13:10:00.001-07:002015-05-05T13:10:35.851-07:00Dilema<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Precisava comprar um guarda-chuva para o Martim, que agora vai de ônibus para
escola e percorre um trecho a pé. Não que ande chovendo muito, mas diz a Lei de
Murphy que a chance de cair um pé d’água aumenta significativamente quando você
não pode chegar ensopado à aula.<br />
Então, na hora do almoço, passei no carrinho do homem do alho que ampliou seus
negócios e agora vende também sombrinhas e guarda-chuvas. Ele deve ter seus
sessenta anos, mas aparenta mais. Pele enrugada e queimada de sol, cabelos
curtos e brancos, sorriso amplo e desdentado, ele exibe os diferentes modelos,
explica as funcionalidades e informa os valores que, bem sei, podem ser
facilmente regateados.<br />
Escolho um modelo, pergunto o preço. Lembro então que estou sem dinheiro. Ele
não aceita cartão. Decido ir almoçar, tirar dinheiro e passar na volta.<br />
Entro na galeria do Copan. Há uma lojinha de quinquilharias que já me salvou em
várias circunstâncias. Tem de um tudo: de fones de ouvido a adesivos de parede
importados, de baterias a lenços de seda e móbiles. E guarda-chuvas.<br />
As donas, duas moças, são sempre simpáticas e atenciosas. Aceitam cartão.
Parcelam. Elas têm o mesmo modelo de guarda-chuva que escolhi no carrinho do
homem do alho. Idêntico. Mesma marca. Mas elas cobram 30% mais caro. Alegam que
o dele deve ser falsificado. Não é. Ninguém gasta energia falsificando
guarda-chuva. Até onde eu sei, guarda-chuva não tem grife.<br />
Estou com fome. Então deixo para decidir depois de comer.<br />
De um lado, o homem do alho, com sua idade, a família que deve ter para
sustentar, a falta de perspectiva e seu carrinho repleto de alhos e
guarda-chuvas.<br />
De outro, as mocinhas das quinquilharias, que pagam aluguel, luz, impostos e
taxas dos cartões, investem no seu pequeno negócio, que deve sustentar seus
filhos pequenos ou seus pais idosos.<br />
Diante disso, de quem eu deveria comprar?<o:p></o:p></span></div>
Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-3757700481577931222015-05-05T13:08:00.003-07:002015-05-05T13:08:58.370-07:00Acolhida<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">ACOLHIDA<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Eram
os últimos dias de 93 e eu nem trinta anos tinha. Grávida do Theo, meu primeiro
filho, decidi passar férias em Jericoacoara, na pousada de um casal de amigos.
Solteira, quem me acompanhou na aventura foi a Paula, que viria a ser a dinda
do primogênito e que já tinha sido minha parceira numa outra viagem estilo
“Thelma e Louise”.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Chegar
a Jeri era uma verdadeira odisseia. Além de algumas horas de voo noturno e
pinga-pinga até Fortaleza pousaríamos pela manhã e só pegaríamos o ônibus até
Jijoca à noite. Viajaríamos 6 horas neste ônibus – que também iria parando ao
longo do caminho – com as bagagens nos pés pois nos haviam dito para não deixar
no bagageiro sob o risco de serem roubadas. Chegando em Jijoca, enfrentaríamos
a última etapa: de jardineira, por uma esburacada estrada de terra e areia.
Roteiro adequado para uma gestante de 5 meses.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Havia
um problema de timing em nosso cronograma. Da chegada ao aeroporto em Fortaleza
até a saída do ônibus para Jijoca teríamos praticamente o dia inteiro. O que
fazer com esse tempo todo disponível? Onde ir? O que fazer com as malas?<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Uma
amiga bem mais velha, sabendo das nossas dificuldades, ofereceu: voces querem
que eu fale com o Zé? Ele é de Fortaleza. Vocês poderiam deixar as bagagens na
casa dele, passar o dia na praia e ao final da tarde vocês voltam, tomam banho
e daí vão pra rodoviária.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">O
Zé era o amante dela. Que era casado. Quem nos receberia seria a esposa dele,
já que ele estava temporariamente morando <st1:personname productid="em Sao Paulo. E" w:st="on">em Sao Paulo. E</st1:personname>, óbvio,
ela não sabia que ele tinha uma amante. Achei aquilo meio esquisito. "Como
ele vai explicar pra ela quem nós somos? Não vai dar confusão?"
"Podem ficar tranquilas," ela garantiu, "ele vai dizer que vocês
são sobrinhas de uma colega de trabalho". O problema, inesperado, não foi
por isso.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Ficou
tudo combinado. Pegamos o endereço e, na data marcada, entre Natal e Reveillon,
lá aparecemos, de malas, cuias e barriga de gestante.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Joana,
a esposa inocente, nos recebeu muito bem. Tomamos um lanche, trocamos as roupas
por biquinis e cangas, os sapatos por chinelos, deixamos as malas num dos
quartos e fomos pra praia de chinelo e sacolinha.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Estava
quente e ensolarado como se poderia esperar de um dia de verão no nordeste.
Passamos o dia na praia, entre águas de cocos e águas do mar. Bronzeadas e
cheias de areia voltamos para nossa base de apoio quando já começava a
escurecer.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Ao
dobrarmos a rua, vimos uma grande movimentação. Muitos carros estacionados,
gente parada no portão da casa conversando em pequenos grupos. Nos
entreolhamos. Será que havia uma festa na casa e Joana não havia nos
comunicado?<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Quando
nos aproximarmos, entretanto, percebemos que as feições estavam tensas, as
vozes sussurrantes, as roupas escuras e formais. E nós de canga, biquini e
chinelo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Constrangidas,
pedimos licença e entramos. Dentro da casa, o clima era ainda pior. Pessoas
choravam, abraçadas. Para a nossa sorte, encontramos a empregada que havia nos
recebido junto com Joana pela manhã e perguntamos o que estava acontecendo.
"Vocês não sabem?"<br />
Não, não tínhamos a menor ideia. Mas era grave. "Carlos, o irmão de dona
Joana, a esposa e o filho mais velho sofreram um acidente de carro hoje. Todos
morreram".<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Não
soubemos o que dizer. Quando tentamos entrar no quarto onde estavam nossas
malas, ao entreabrir a porta vimos uma moça soluçando na cama. Ao lado de nossa
bagagem. Recuamos. E agora?<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Ficamos
paradas na porta do quarto sem saber o que fazer. De canga, biquini e chinelo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">No
momento em que percebemos que o choro diminuiu de intensidade, entramos
silenciosamente, pegamos nossas coisas e nos retiramos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Entramos
no banheiro, trocamos de roupa sem tomar banho (pois não queríamos interditar o
banheiro por muito tempo e nem pedir toalhas pra ninguém). Fomos embora rumo a
rodoviária, cheias de sal, areia e sem nos despedir da nossa anfitriã.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Nunca
mais a vi, nunca tive oportunidade de me desculpar ou agradecer.<o:p></o:p></span></div>
<span style="font-family: Georgia; font-size: 12.0pt; mso-ansi-language: PT-BR; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-language: AR-SA; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Então, Joana, obrigada pela acolhida. </span>Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-72004366184550856702015-05-05T13:06:00.001-07:002015-05-05T13:06:19.675-07:00Tinha dezesseis<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">e
estava acampada em Trindade, com meu namorado - o Índio, quase seis anos mais
velho que eu.<br />
Aos dezesseis, a vida é uma série de grandes novidades. Quase tão fantásticas
quanto aquelas – creio eu, mas não me recordo – com as quais nos defrontamos
quando, lá pelo primeiro ano de vida, começamos a andar: o ângulo de visão de
mundo se altera, achamos que podemos ir aonde bem entendemos sem dar maiores
explicações aos nossos pais, corremos riscos, damos cabeçadas, queremos
explorar caminhos, encontrar novas paisagens.<br />
Então lá estava eu, passando um mês de férias com meu namorado, sem pai nem
mãe, acampada em Trindade, no final da década de 70.<br />
Pés descalços, cabelos despenteados, pele curtida pelo sol e temperada com o
óleo de coco Bahia, muito PF de ovo na casa do seu Antônio e da dona Clara,
banhos de cachoeira... O que mais uma adolescente poderia querer?<br />
E havia o amor. Índio era tudo que uma teenager poderia sonhar – forte, cabelos
longos, cara de mau que se dissolvia em um sorriso maroto, baterista de uma
banda de rock, MUITO mais velho que eu (quase seis anos é uma diferença enorme
nesta época da vida) e – a cereja do bolo – ele me amava. E eu amava muito tudo
isso.<br />
Entretanto, (há sempre um “entretanto”) ele era ciumento.<br />
Naquela tarde, depois de um dia intenso de amor, caminhadas e mar, quando
estávamos tomando nosso banho de cachoeira, decidi ficar topless – eu era
moderninha e estávamos na década de 70, for god’s sake! Mas eis que um grupo de
moços resolve aparecer bem nessa hora. E olhar para os meus peitinhos.<br />
Pronto. Índio não disse uma palavra, mas o tempo fechou. Não aquela tempestade
de raios e trovões. Não. O clima ficou, abafado, tenso na iminência de cair o
mundo.<br />
Fomos pro boteco da Praia do Meio, tomar uma cerveja ao final da tarde, antes
de voltarmos pra praia do Cepilho, onde estávamos instalados. Ele mal falava
comigo. Engatou numa conversa com os caiçaras, me deixando sozinha no balcão.<br />
E então pedi uma pinga. Depois outra. Depois mais outra. E, talvez, mais outra.
Não lembro. Mas lembro, que lá pelas tantas, sentindo-me abandonada e
entorpecida, decidi voltar sozinha para o aconchego da nossa barraca.<br />
Saí sem dizer nada e sem que ele visse. Fui, aos trancos e barrancos, pela
estrada esburacada, enquanto a noite caia.<br />
Ao chegar lá, já noite fechada, tive uma brilhante ideia. “Vou fazer um
macarrão pra ele”, pensei, “ele vai estar chateado e com fome e vai ficar muito
feliz em encontrar uma macarronada pronta”.<br />
Peguei a panela, acendi uma vela depois de gastar meia caixa de fósforos e me
dirigi até a bica, ao lado da casa do seu Antônio e da Dona Clara. Enchi a
panela de água, voltei para barraca, coloquei em cima do fogareiro mas, quando
fui tentar acender o fogo, derrubei a panela, derramando toda a água.<br />
Ainda assim, resolvi tentar mais uma vez. Munida de vela e panela, voltei à
bica, enchi de novo e comecei meu caminho de volta. Não era um caminho longo <st1:personname productid="em absoluto. A" w:st="on">em absoluto. A</st1:personname> praia toda
deve ter uns cem metros. E o meu percurso deveria ter uns cinquenta. Mas eu já
havia andando muito, e havia bebido um tanto. Então, simplesmente desisti.
Enterrei a vela ao meu lado, me livrei da panela, deitei na areia e, como se
ali fosse a mais confortável das camas, caí no sono.<br />
Algum tempo depois, Índio, que também havia tomado umas e outras e, àquelas
alturas já estava arrependido do tratamento que havia me dispensado, chegou ao
Cepilho e se deparou comigo apagada no meio da praia.<br />
Aproximou-se, chamou, me sacudiu e diante de minha total falta de reação
começou a me dar uns tapas.<br />
Os filhos de seu Antônio e dona Clara, que estavam vendo a cena de longe,
puseram-se a gritar: “O Índio ta matando a Claudia! O Índio ta matando a
Claudia!”. Neste ponto, o Banzé que era um amigo nosso que também estava
acampado ali, ouviu a gritaria e foi ver o que estava acontecendo.<br />
Banzé, então, se depara com a seguinte cena: eu deitada na areia, desacordada,
Índio, debruçado na minha barriga chorando e pedindo perdão, ao nosso lado uma
vela acesa.<br />
Ele corre até nós é começa a gritar: “Índio! O que você fez com ela?! O que
você fez com ela?!” Este, soluçando, responde: “eu tive que fazer! Eu tive que
fazer!”<br />
A Bela Adormecida então desperta, com cara de que não sabe onde está nem como
chama. “Ahn?!”<br />
Banzé, pra ele: você não deveria ter feito isso com ela, seu idiota!<br />
E pra mim: Mas você merecia apanhar, sua tonta!<br />
O show estava completo. Seu Antônio, dona Clara, seus dez filhos, agregados e
outros campistas, assistiam ao espetáculo e, quando Índio me pegou no colo e me
aninhei em seus abraços, recebemos uma salva de palmas e assobios.<br />
Não, não fomos felizes para sempre. Mas fomos felizes até final daquele verão.<o:p></o:p></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">(Para <a href="https://www.facebook.com/silvana.augusto.779">Silvana Augusto</a>, que
não gosta de ler textos longos no Facebook)</span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-9Wz0cyLUkXs/VUkiqvwOG0I/AAAAAAAAJGg/HbjmO2uddks/s1600/Trindade01.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="http://1.bp.blogspot.com/-9Wz0cyLUkXs/VUkiqvwOG0I/AAAAAAAAJGg/HbjmO2uddks/s1600/Trindade01.JPG" /></a></div>
<o:p></o:p>Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-71751855299592404572015-05-05T12:58:00.001-07:002015-05-05T12:58:07.885-07:00Na Caixinha<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-0vJjx3GSLMw/VUkglr4XCAI/AAAAAAAAJGU/Frc9mWWn2T0/s1600/caixinha.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" height="320" src="http://4.bp.blogspot.com/-0vJjx3GSLMw/VUkglr4XCAI/AAAAAAAAJGU/Frc9mWWn2T0/s320/caixinha.jpg" width="240" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Demissão
homologada, fui sacar o Fundo de Garantia na agência da Caixa mais próxima.<br />
Caminho até a Domingos de Morais, entro na agência, retiro a senha no totem e
aguardo. O local está vazio e rapidamente sou atendida. Que bom, penso. Vai ser
rápido.<br />
Então, o tipo que me atende, pega os papéis, olha pra mim. Olha os papéis de
novo. Clica seu mouse, olha o computador. E me devolve os papéis. “Lamento”.
Olho sem entender. “Não tenho alçada para isso”. Continuo olhando. Ele explica:
“É o valor. Você trabalhou muitos anos?” Aceno que sim. “Então. O computador
não autoriza. Você vai ter de ir lá <st1:personname productid="em cima. Falar" w:st="on">em cima. Falar</st1:personname> com a Ivone ou com a Edileusa”. E
arremata “se a minha autoestima dependesse do que este sistema me autoriza, eu
já estaria <st1:personname productid="em depressão. Volte" w:st="on">em
depressão. Volte</st1:personname> ali no totem e pegue uma nova senha. Mas
deve ser rápido.”<br />
Faço o que ele diz. De posse do novo número, subo. Ivone e Edileusa estão
ocupadas. Aguardo. Mas, como já é hora do almoço, Ivone sai e quem me atende é
sua assistente, Débora, que não deve ter mais que 22 anos.<br />
Sorri seu sorriso Caixa. Pega meus papéis. Ergue a sobrancelha. “Veio resgatar
seu Fundo?” Aceno positivamente. “Não quer aproveitar e abrir uma conta aqui na
Caixa?” “Não, obrigada” – respondo educada, mas categórica. Seu sorriso Caixa
desaparece.<br />
Ela se concentra nos papéis que lhe entreguei.<br />
Ergue a cabeça e aponta, veemente, para um dos campos do termo de rescisão de
contrato. “Aqui”, diz triunfante, “falta a Unidade da Federação – SP, está
vendo?! E aqui também, estes dois campos, estão sem preencher. Tinha que estar
escrito ‘zero’”.<br />
Olho para ela ainda sem entender o que está acontecendo. “Como assim?” É só o
que consigo dizer.<br />
“Você vai ter que voltar na empresa e eles vão ter de escrever uma observação
neste documento. Aí você volta aqui.”<br />
“Você está dizendo que não posso transferir meu fundo por causa disso? Acabei
de homologar, está tudo certo, conferido. Que importância tem isso? Dois
zeros?? E a unidade da federação, que, por sinal, tem outro campo em que isso
está escrito!?”<br />
“Para a Caixa é muito importante. Você não pode sacar sem isso. Tem que fazer a
retificação.” Ela está vingada.<br />
Ligo pro Carlão, do RH, na frente dela. Ele não acredita. “Funcionária da
Caixa”, bufa ele “é assim, encasquetou. Tenta em outra agência. Se não der,
mando recolher o formulário na sua casa.”<br />
Fico exasperada. Tirei o dia pra resolver este assunto e não vou conseguir. No
dia seguinte, estarei fora de São Paulo.<br />
Encaro a menina “È sério mesmo? Você vai criar caso por causa disso?”. Ela não
responde.<br />
Arranco os papéis das mãos dela e desço a escada pisando forte.<br />
Não sei o que fazer. Estou com fome. Irritada. Vou caminhando em direção ao
metrô. Antes de descer as escadas, decido perguntar se há uma agência da Caixa
por ali.<br />
Há. Dobrando a esquina. Respiro fundo e entro.<br />
No totem, aviso o moço que se trata do FGTS mas precisa ser com alguém da gerência.
Ganho uma senha e dois nomes: P<st1:personname w:st="on">aloma</st1:personname>
e Suzana.<br />
“Desta vez”, penso, “não vou aceitar outra qualquer”.<br />
Subo a escada e pergunto por elas. P<st1:personname w:st="on">aloma</st1:personname>
está disponível. É uma menina. Mas tem um sorriso. Um sorriso que não é da
Caixa.<br />
Ela me diz pra sentar. Estendo meus papéis pra ela. “Você que vai resolver meus
problemas?” “Claro! Que problemas?” “Preciso resgatar este Fundo hoje. Tem
jeito?” “Tem, lógico”. E ela vai passando os olhos naquele mesmo formulário e
conferindo os dados relevantes com meus documentos.<br />
“Você não vai aplicar pelo menos uma parte?” ela pergunta. “Vou sim”. “Já sabe
em quê?” “Uma parte quero deixar em algum rendimento de médio prazo e uma parte
tem de ser daqueles com baixa automática”.<br />
E então, com simpatia, tato e uma planilha com as porcentagens dos rendimentos,
ela me oferece a opção do seu banco. E eu decido então aceitar sua proposta e
deixar a maior parte do dinheiro com ela.<br />
No mais conversamos sobre a faculdade que ela está fazendo – administração – e
seu sonho – veterinária. E sobre vir para São Paulo e viver sozinha e sobre e
correr e sobre ter lesões e namorados. Ela só tem 22 anos. Provavelmente a
mesma idade da outra (como ela chamava mesmo?). Enquanto isso, ela libera meu
Fundo, faz a transferência, abre a conta para a aplicação, me mostra como
funciona o site. Tudo isso leva uns 40 minutos.<br />
Despedimo-nos como velhas amigas.<br />
Vou caminhando em direção ao metro. Então, me lembro de Julia Roberts e estico
a caminhada de volta até a primeira agência.<br />
Subo até o primeiro andar. E a moça do sorriso caixinha está atendendo um
jovem.<br />
Estico os dois papéis na frente do seu nariz: o formulário rejeitado e o
comprovante dos meus títulos de investimento recém adquiridos.<br />
“Big mistake... huge...” digo, sorrio e saio requebrando escada abaixo</span><span style="background: white; color: #141823; font-family: Georgia; mso-bidi-font-family: Helvetica;">.</span><span style="font-family: Georgia;"><o:p></o:p></span></div>
Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-7746477069499929912015-05-05T12:41:00.001-07:002015-05-05T12:41:30.855-07:00Pai<br />
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Não
me lembro de meu pai sem barba. Em algumas de minhas primeiras fotos, ainda
bebê, há um rapazote imberbe e magriça que dizem ser meu pai. Duvido um pouco.
Meu pai nasceu barbado. Não uma barba qualquer, desgrenhada. Uma barba rente,
comportada, simétrica. Uma barba confiável. Meu pai é – e sempre foi – a pessoa
mais confiável que conheço. Ele nasceu com sistema GPS – muito antes disso
existir. Em qualquer lugar do mundo pega o carro e sabe chegar ao hotel, à casa
do amigo, àquele pequeno restaurante escondido no meio das montanhas. Ele sabe.
Ele sempre soube.<br />
Até hoje, nunca bateu o carro. Nunca foi multado. Nunca molhou a mão de
ninguém. Nunca sonegou impostos. Nunca escolheu atalhos, facilidades ou
gambiarras. Pagou o preço de suas escolhas.<br />
Não trocou minhas fraldas, nem deu mamadeira. Mas me ensinou a jogar vôlei,
brincar de beisebol, andar de bicicleta. Ele nos levou, a mim e minha irmã
Silvia, no estacionamento da Faculdade de Saúde Pública da USP, ali na dr.
Arnaldo, tirou as rodinhas nos empurrou, uma de cada vez, até que nos
sentíssemos seguras e equilibradas – então nos deixava pedalando por conta
própria.<br />
A gente velejava. Carregava a vela o mastro o leme e a bulina até a beira da
represa e aprendia como encher a vela com o vento em popa e a voltar pra casa,
mesmo com o vento contra. E a ouvir o barulhinho que água fazia ao ser singrada
por nosso pequeno Starfish. E a se incomodar com os motores poluentes das
lanchas.<br />
Entrei na escola já alfabetizada porque ele me ensinou a ler. Pacientemente, com
a pata nada.<br />
Tirou fotos fotos e mais fotos toda nossa infância. Tínhamos um quarto escuro
no fundo da casa, cheirando a revelador. Lá víamos a transformação do momento <st1:personname productid="em papel. As" w:st="on">em papel. As</st1:personname> luzes e
sombras aparecendo lentamente dentro daquela bandeja rasa sob a luz amarelada e
depois as imagens eram mergulhadas novamente noutra bandeja que as fixava para
sempre àquele papel e então eram penduradas naquele mini varal, em versões mais
luminosas e outras mais sombrias. Éramos nós naquelas imagens e a entrada naquele
quartinho para assistir às revelações era um prêmio. Algum de nós teria mesmo
de virar fotógrafa.<br />
E colado à câmara escura, o quartinho. Com as ferramentas e os parafusos e
porcas e preguinhos e pregões separados por tamanho tipo finalidade. E ele
sempre sabia (sabe até hoje) quando a gente tinha tirado alguma coisa de seu
posto.<br />
A gente cresceu e não quis mais que ele tirasse fotos – ou melhor, quis que ele
achasse que a gente não queria – mas a gente continuava gostando do olhar dele
sobre a gente. Mas ele acreditou e tirou cada vez menos fotos.<br />
Nos transformamos naqueles estranhos seres de 14, 15, 16, 17 e 18 anos. Mesmo
assim, ele jogou vôlei com nossos amigos e deixou que usássemos o veleiro e
tolerou os namorados cabeludos e maconheiros. Não. Não tolerou apenas. Aceitou.
Levou pra Ibiúna e pra João Pessoa.<br />
E eu fui indo pra longe dele. Muito longe. Até o dia em que quebrei. Acabei com
o carro na praça 14 Bis, e ele, convalescente de uma cirurgia, saiu de casa no
meio de uma fria madrugada de inverno e foi me buscar. Não disse uma palavra.<br />
E no dia seguinte não aguentei ter feito o que fiz, e fiz ainda pior. Quase
morri. Idiota. Agora eu sei. Idiota.<br />
Mas não é sobre mim, é sobre ele. Que teve de lidar com a filha que caiu no
fundo do poço. Aos dezenove anos, foi dormir no quarto dos pais. Por que era o
único lugar seguro.<br />
Um pouco mais tarde, em Londres, ele me visitou. E voltou a tirar fotos. E
contou de si. E esteve tão perto, tão perto, que tive saudades antes de ele ir
embora, porque sabia que aquele encontro era um reencontro e um novo encontro.<br />
A vida adulta chegou e foi-se impondo. Ele ficou lá, como no dia em que nos
ensinou a andar de bicicleta – empurrando, incentivando, ajudando a encontrar o
ponto de equilíbrio para nos soltar.<br />
Não paro de aprender com ele. Quando minha carreira foi me levando pra gestão,
nosso rol de assuntos em comum se ampliou.<br />
Ele admira minhas façanhas esportivas. Orgulha-se de meus feitos acadêmicos.
Incentiva. Vibra. Faz perguntas. Conta pros amigos.<br />
Gosto do olhar dele – com lentes ou sem lentes – sobre mim.<br />
Admiro a incrível disposição que ele tem de ajudar minhas irmãs organizar suas
vidas. Sem invadir, sem palpitar – colocando cada parafuso no lugar mais
funcional, a chave de fenda no lugar mais acessível.<br />
E a barba foi ficando cada vez mais branca. Totalmente branca. Continua rente,
comportada, simétrica. Mas agora é mais aconchegante.<br /><o:p></o:p></span></div>
<span style="background-color: white; color: #141823; font-family: helvetica, arial, 'lucida grande', sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.3199996948242px;"></span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-vz6dUop0Agw/VUkci5eQU9I/AAAAAAAAJFY/pydCgssT3cc/s1600/Claudia%2BAratangy%2Btratadas%2B-0500.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="266" src="http://2.bp.blogspot.com/-vz6dUop0Agw/VUkci5eQU9I/AAAAAAAAJFY/pydCgssT3cc/s400/Claudia%2BAratangy%2Btratadas%2B-0500.jpg" width="400" /></a><span style="background-color: transparent; font-family: Georgia; line-height: 150%;">Obrigada, pai, por me deixar ser filha.</span></div>
Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-47576604163847535212015-05-05T12:28:00.000-07:002015-05-06T10:41:09.836-07:00Aconteceu com a amiga de uma amiga I<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia; line-height: 150%;">Ela
viajou a trabalho para uma capital do Nordeste. Ficou hospedada num hotel
luxuoso de um bairro nobre da cidade. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Cansada
de passar o dia com “a turma da firma” achou melhor ir jantar sozinha. Uma
conhecida sua, nativa, indicou-lhe um restaurante fora do circuito turístico,
onde poderia comer uma carne de sol da melhor qualidade.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Depois
de um dia extenuante, tomou um banho, arrumou-se, dirigiu-se à recepção do
hotel e perguntou onde poderia pegar um táxi. O recepcionista solícito lhe
informou que logo ali em frente havia um ponto e os motoristas eram todos de
confiança, pois prestavam serviço pro hotel desde sempre.<br />
Chegou ao local, dirigiu-se até o primeiro carro da fila. Um senhor, já de
certa idade, abriu-lhe a porta, desejou boa noite e perguntou para onde iam.<br />
- Vamos ao restaurante “Bode derretido”. O senhor conhece?<br />
- Conheço não.<br />
- Fica na rua Desembargador Proença. Sabe onde fica?<br />
- Sei não.<br />
- O senhor não tem um guia ou um GPS?<br />
- Tenho não. Eu paro ali adiante e me informo com meus colegas.<br />
Deu a partida e saiu andando.<br />
- Não, moço. Peraí um segundinho.<br />
De posse de seu celular, rapidamente abriu o Waze, colocou o endereço e <st1:personname w:st="on">Raquel</st1:personname> começou a dar suas ordens.<br />
- Em <st1:metricconverter productid="200 metros" w:st="on">200 metros</st1:metricconverter>
vire à direita.<br />
O motorista, em vez de virar à direita em <st1:metricconverter productid="200 metros" w:st="on">200 metros</st1:metricconverter>, freou
bruscamente e virou-se para <st1:personname w:st="on">Raquel</st1:personname>.<br />
- Mas o que é isso?<br />
- É um GPS, moço, é ligado num saté...<br />
- A senhora está me dizendo que o seu aparelho de celular sabe o caminho?<br />
- Sim, moço, é só ir seguindo as orientações dessa moça que...<br />
- A senhora, por acaso, é daqui de Maceió?<br />
- Não, moço, mas esse apare...<br />
- Essa moça aí, que está me mandando virar pra direita, é daqui de MACEIÓ??<br />
- Moço, é uma gravação do GPS, que...<br />
- Ela é de MACEIÓ?????<br />
- Não, mas é que o celular tem o...<br />
- E o seu CELULAR, ele por acaso é DAQUI DE MACEIÓ??????<br />
- Não, moço, na verdade ele...<br />
- E a senhora acha que eles que não são daqui, vão saber o caminho? Vão ME
ENSINAR o caminho? Danou-se. Não viro à direita não. Não levo a senhora não.
Façam o favor de descer do carro, a senhora, essa moça e esse seu celular. Já
que eles sabem tudo, quem sabe não arranjam outro carro pra senhora?!<br />
Dito isso, abriu a porta e esperou minha amiga, atônita, descer.<o:p></o:p></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-AyIGpGOHY4g/VUka_fMTtcI/AAAAAAAAJFM/-10guXJZfVw/s1600/waze.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" src="http://1.bp.blogspot.com/-AyIGpGOHY4g/VUka_fMTtcI/AAAAAAAAJFM/-10guXJZfVw/s320/waze.jpg" height="320" width="180" /></a><span style="font-family: Georgia;">Não
deu nem boa noite.<br />
Ela ainda tentou ver se conseguia um carro com 99Taxis. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%;">
<span style="font-family: Georgia;">Em vão.<o:p></o:p></span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-95846992717101765.post-30191648252316695762015-05-05T12:17:00.004-07:002015-05-05T12:31:25.006-07:00Sobre caprichos e letras ou a síndrome do borrão<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify; text-indent: 35.45pt;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-LTLrSYZo_6w/VUkXJ3ArDOI/AAAAAAAAJE0/TrzGBLqW5dM/s1600/FullSizeRender.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="320" src="http://2.bp.blogspot.com/-LTLrSYZo_6w/VUkXJ3ArDOI/AAAAAAAAJE0/TrzGBLqW5dM/s320/FullSizeRender.jpg" width="240" /></a><span style="font-size: 12.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 10.0pt;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Até
hoje é assim: não consigo traçar uma linha reta nem mesmo com uma régua. Por
mais que calcule, fique firme e concentrada, ela se inclina. Se a reta tiver de
ser maior que a régua, tanto pior: nunca acerto o ponto de junção. Pode parecer
piada, mas mesmo com o computador, algumas vezes as tabelas teimam em sair
tortas ou desiguais — não sei que besteira consigo fazer, mas a linha de uma
coluna se desencontra da linha de outra coluna, o tamanho das células fica
diferente e quanto mais tento consertar, pior fica.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify; text-indent: 35.45pt;">
<span style="font-size: 12.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 10.0pt;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Não
é de hoje esta a sensação: o que quer que eu faça, é impossível que resulte
imaculado.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify; text-indent: 35.45pt;">
<span style="font-size: 12.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 10.0pt;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Quando
estava no primário, as minhas lições nunca ficavam limpas. Tenho a impressão de que os professores não
nos ensinavam como usar a borracha. Os
meus escritos ficavam mal apagados, com uma escrita mais forte por cima dos
borrões. Muitas vezes também acontecia
de eu passar a borracha com tanta força que acabava por rasgar o papel. Tinha mãos de moleca, raramente não estavam
com um pouco de terra, pó de giz, restos de tinta ou mesmo com uma pitada de
manteiga ou nescau, restos do lanche.
Claro que as professoras nos mandavam lavar as mãos depois do recreio
mas, por algum mistério inexplicável, as minhas voltavam a se sujar
magicamente. Então, com a melhor das intenções, para conseguir cravar o lápis –
ainda preso por mãos muito inexperientes no ato da escrita – segurava a folha
deixando assim minhas impressões digitais. Ou seja, as lições eram um amontoado
de borrões multicoloridos, rasgos e uma escrita em cinquenta tons de
cinza. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify; text-indent: 35.45pt;">
<span style="font-size: 12.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 10.0pt;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Sempre
gostei de cadernos novos, com aquelas folhas branquinhas, as páginas
apertadinhas umas contra as outras.
Adorava estreá-los e escrever principalmente nas folhas do lado direito,
que eram mais firmes. Mas minha alegria durava pouco. Primeiro – eu não
conseguia encapar direito. Cortava um
papel ou um plástico pequeno ou grande demais.
Colocava o durex torto e, quando percebia que não era só durex mas o
papel e a dobra também que estavam desalinhados, então eu tinha de arrancar o
durex e lá se ia uma lasca do meu caderno.
Em seguida, soltava o miolo da capa, as pontas das folhas se dobravam
por vontade própria e, óbvio que ele parecia ter um impulso suicida, se jogando
da minha mão ou caindo da minha mala quando eu estivesse passando perto de
algum lugar sujo e, de preferência, molhado.
O pior é que eu teria de conviver com aquele maltrapilho até o fim do
ano letivo. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify; text-indent: 35.45pt;">
<span style="font-size: 12.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 10.0pt;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Odiava
aquelas meninas que entregavam as lições impecáveis – e eram sempre
meninas. Como elas conseguiam? Pareciam não ter de fazer esforço algum para
deixarem seus trabalhos intactos. Eram donas de borrachas branquinhas – que
nunca escureciam, e de lápis cujas pontas estavam sempre afiadas. Seus cadernos
estavam sempre novos – encapados com papéis cor de rosa ou floridos, não
sujavam nem rasgavam. Elas também eram capazes de tomar o toddy que traziam
naquelas garrafinhas de plástico das lancheiras sem derramar nem uma gota. E suas garrafinhas nunca vazavam dentro da
lancheira, melecando tudo, como acontecia com a minha. Ah, que inveja.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoBodyTextIndent">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Um dia consegui fazer uma lição de casa (e estas
eram as piores, pois sempre amassavam no caminho de ida ou volta da escola) sem
nenhuma mancha e sem amassar. Chegando à
minha classe, coloquei, orgulhosa, a lição sobre a mesa à espera de que a
professora viesse recolhê-la. Um golpe
de vento lançou minha folha ao chão e, antes que eu tivesse tempo de
resgatá-la, um colega desavisado pisou bem em cima dela, deixando a marca de sua
sola.</span></div>
<div class="MsoBodyTextIndent">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">No ginásio, isso passou a me incomodar mais. Começaram os trabalhos em grupo, os
seminários e a nota para “apresentação” (leia-se “capricho”). Nunca tirei um 10, um “O” (de “ótimo”) ou um
“A” neste quesito. Lembro-me uma vez, na
quinta série, que tínhamos de fazer, em duplas, um cartaz com uma linha do
tempo. Além de eu estar totalmente
confusa com alguns dos conceitos envolvidos naquela atividade – não entrava na
minha cabeça a os tais anos a.C., que iam em contagem regressiva até o ano zero
– minha dupla, como era muito mais inteligente do que eu, decidiu que ela faria
a pesquisa e o rascunho e eu apenas passaria para a cartolina. Fiz o meu melhor, mas ela não gostou. Sem nenhuma concessão, espírito de equipe ou
solidariedade, jogou o que eu havia feito fora, fez um novo e, no canto da
folha escreveu:</span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify; text-indent: 35.45pt;">
<i><span style="font-size: 12.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 10.0pt;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Pesquisa – Liliane K.<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify; text-indent: 35.45pt;">
<i><span style="font-size: 12.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 10.0pt;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Linha do tempo – Liliane K.<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify; text-indent: 35.45pt;">
<i><span style="font-size: 12.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 10.0pt;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Texto – Liliane K.<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify; text-indent: 35.45pt;">
<i><span style="font-size: 12.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 10.0pt;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Resto – Claudia Aratangy.<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify; text-indent: 35.45pt;">
<span style="font-size: 12.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 10.0pt;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">No
colegial , o problema continuou. Mas, no Equipe lugar onde estudei na década de
70, tanto forma quanto o conteúdo eram valorizados, entretanto, havia maneiras
alternativas de apresentar aquilo que sabíamos – audiovisuais e exposições
orais, por exemplo, estavam no mesmo patamar que os trabalhos escritos. Uma vez, eu e minhas queridas colegas fizemos
um belíssimo trabalho – uma entrevista com um dramaturgo e autor de
telenovelas. Nem me lembro sobre o que
conversamos com ele, mas sei que nos saímos muito bem. Como deixávamos tudo para última hora, não
houve tempo de passar a entrevista a limpo.
Resultado: conteúdo A+, apresentação E. A diferença é que eu não estava
muito preocupada.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify; text-indent: 35.45pt;">
<span style="font-size: 12.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 10.0pt;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E
quem se lembra das transparências? Sim, foram muito úteis para os felizardos
dotados das coordenações mão-boca e viso-motoras. Sim, as transparências ajudaram muito quem
era capaz de falar sem perder o fio da meada ao mesmo tempo em que <b>não</b> colocava o acetato de ponta-cabeça,
conseguia cobrir a parte debaixo e não a de cima e direcionar a luz de modo que
a exposição na tela ficasse numa altura e foco que todos os participantes
conseguiam enxergar. Eu sou daquelas
que, além de não conseguir nada disso, ainda deixava a transparência
escorregar, não achava a próxima folha e esquecia o ponto onde havia parado
antes de ir pegar aquela que foi se esconder embaixo da mesa. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify; text-indent: 35.45pt;">
<span style="font-size: 12.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 10.0pt;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O
computador, com seus programas maravilhosos, é um inegável aliado de quem, como
eu, sofre da síndrome do borrão. Mas
mesmo assim, posso levar horas para, numa apresentação em PowerPoint, por
exemplo, que os <i>bullets</i> não fiquem
mudando de formato ou para que a imagem não fique empurrando o texto pro lugar
errado. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify; text-indent: 35.45pt;">
<span style="font-size: 12.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 10.0pt;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Minha
letra era – e ainda é –, um capítulo à parte.
Não houve exercício de prontidão, psicomotricidade ou cadernos de
caligrafia que tenham dado jeito nela – “ondinha vai, ondinha vem” (lembram?) e
a minha letra foi por água abaixo. Uns culpavam o modo como seguro o lápis –
com a mão virada para dentro, como canhota, sendo destra; outros, a escola
“moderna”, que não infernizou minha escrita o suficiente. Fato é, que todos os
esforços no sentido de tornar minha letra decente foram inúteis. Tive e tenho uma letra ridícula. Diferente do meu irmão, que também tinha uma
letra torta, amontoada e irregular e que hoje tem uma respeitável letra de
engenheiro (mesmo que seja economista), parecida com a do meu pai – firme,
decidida, angulosa e, principalmente, legível – a minha não evoluiu. Nasceu torta e, ao que tudo indica, torta
morrerá. Minha letra tem parentesco com a letra de minha irmã <st1:personname productid="Silvia e com" w:st="on">Silvia e com</st1:personname> a da minha
mãe, numa versão piorada. É pequena, infantil, tímida, às vezes rasteja pela
linha, quase sumindo, cheia de interrupções onde não deveria e de junções, onde
não poderia. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify; text-indent: 35.45pt;">
<span style="font-size: 12.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 10.0pt;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Definitivamente, não tenho a chamada “letra de
professora”. Quando dava aula aos
pequenos, escrevia sempre em letra de forma que, mesmo assim, estava sempre
deformada, de modo que os alunos, recém-alfabetizados, não conseguiam entender
se eu havia escrito “gato” ou “cato”.
Hoje, quando vou dar cursos ou palestras, evito ao máximo ter de usar a
lousa ou o “flipchart”. Além da minha
total incapacidade de prever o tamanho necessário da letra para que caiba tudo
o que tenho de escrever – o resultado é um amontoado de letras miúdas e
espremidas no canto inferior do quadro.
Isso sem falar na minha impossibilidade de escrever em linha reta. Ao sabor não sei de que ventos, minha escrita
sobe e desce, navegando pela lousa. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify; text-indent: 35.45pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><span style="font-size: 12.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 10.0pt;">E
a assinatura? Nunca consegui criar uma rubrica. Morro de inveja do meu marido,
que faz aqueles salamaleques todos que resultam num símbolo ilegível, porém firme
e regular. É a sua marca, seu carimbo. O
meu, “</span><st1:personname productid="Claudia R. Aratangy" w:st="on"><span style="font-size: 12pt; line-height: 150%;">Claudia R. Aratangy</span></st1:personname><span style="font-size: 12.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 10.0pt;">“, por
extenso, com o “Rosenberg” abreviado, é patético. Em algumas situações, tenho
vergonha de assinar. No ambiente responsável, comprometedor e sisudo das
páginas de um contrato, como colocar uma assinatura tão pueril? Assino sempre
com o receio de que os contratantes resolvam voltar atrás depois de ver minha
assinatura. “Com uma letra dessas, como
poderá ser uma profissional competente?” perguntariam eles. Até hoje isso,
felizmente, não aconteceu, mas, confesso, que aguardo ansiosamente a
popularização da assinatura eletrônica.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify; text-indent: 35.45pt;">
<br /></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify; text-indent: 35.45pt;">
<span style="font-size: 12.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 10.0pt;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> </span><o:p></o:p></span></div>
Claudiahttp://www.blogger.com/profile/01668631353074926787noreply@blogger.com0