terça-feira, 5 de maio de 2015

Garanta Vermelha - minha nórdica paixão

Encontrei o norueguês Jo Nesbø porque procurava. Navegava pela internet em busca de um novo romance. De preferência, nórdico. Policial.  Depois de ler a trilogia Millenium (Stieg Larsson) e o Homem de Beijing (Henning Mankell) não queria outra coisa.
A combinação de uma trama bem montada com personagens densos na paisagem gelada da Escandinávia me enfeitiçou. E, assim, por acaso,  topei com Garganta Vermelha
Bastou ler três páginas para não conseguir mais fazer outra coisa da vida. Sorte minha, que estava de licença médica em casa. Azar meu. Mal sabia o grau de dependência que iria me acometer.
Garganta Vermelha não é um livro para iniciantes.  A história se desenrola em duas épocas diferentes:  atual e durante a 2ª Guerra. Além disso, o ângulo da narrativa transita entre alguns personagens. É como se o leitor estivesse olhando por um caleidoscópio. Aos poucos, entretanto, as imagens vão se conectando e o sentido aparecendo. Em alguns momentos, até o mais experiente dos leitores vai duvidar de seu entendimento e ter de voltar algumas páginas pra checar se não está se confundindo.
A tensão e o suspense, típicos dos filmes e romances policiais, são crescentes do começo ao fim mas também aparecem em cenas, ops, capítulos, ao longo do livro.
O que realmente me ganhou foi o herói. Ou o anti-herói. Harry Hole é um policial atormentado por seus fantasmas. Como muito dos detetives americanos da década de 50,  é um renegado. Antissocial, alcoólatra, fumante, encrenqueiro, insubordinado, impulsivo, obsessivo-compulsivo. Mas, como eles também, é brilhante, irônico e enxerga além das aparências. E tem mais. É leal, passional, corajoso e tem um tremendo senso de justiça. Magro, alto (1,92 pra ser exata), olhos azuis, cabelos raspados e, a cada aventura, ganha novas cicatrizes tenebrosas, que não conseguem enfeiá-lo. É um pouco atrapalhado com as mulheres. Ainda assim, não deixa de conquistar corações entre um assassinato e outro.
Além disso, nem sempre os piores vilões são os assassinos. Isso cria, na história, enredos paralelos - que às vezes levam dois, três até quatro volumes para o desenlace!
Os coadjuvantes, que aparecem mais em alguns livros do que os outros, também tornam-se nossos velhos amigos. Como Harry, são também um pouco desajustados: nerds, bipolares, alcoolatras...humanos.

Foto de Cato Lein - site oficial Jo Nesbo
O autor tem uma trajetória curiosa. Filho de bibliotecária e professor, gostava de ler, mas era péssimo aluno. Sonhava em jogar no Totenham, então começou pelo Molde FC e só parou porque teve problemas no joelho.
Recuperou o tempo perdido, cursou economia e foi trabalhar no mercado financeiro. De dia. À noite cantava numa banda pop - Di Derre. Gravaram discos, fizeram turnês e alcançaram um relativo sucesso. Nesbo era o letrista.
A vida dupla era muito puxada. E ele também sentia que seu perfil não era adequado para orientar investidores. Sincero demais. Cansou. Largou a banda, o emprego e foi fazer um sabático na Austrália. Uma amiga, editora, sugeriu que ele escrevesse um livro sobre a sua experiência na banda. Mas ele voltou com Harry Hole.
Depois de Garganta Vermelha, persegui Jo Nesbo incansavelmente. No Brasil, ele tem publicado pela Record, A Casa da DorA Estrela do Diabo  e O Redentor. Na FNAC encontrei e/ou encomendei, em inglês, The SnowmanThe Leopard, Phantom, The Bat  e, o único que não é com Harry Hole, Headhunters.
The Bat é o primeiro mas foi publicado em inglês somente depois que ele se consagrou como escritor. Não é sofisticado como o terceiro (Garganta Vermelha), mas vale a leitura, principalmente porque é onde nasce o personagem. E dá pra perceber a evolução de Nesbo como autor.  O segundo, The Cockroaches, é o único que ainda não consegui comprar. 
Em 13 de outubro passado ele lançou Police. No dia seguinte, encomendei pela Amazon. Demorou um mês pra chegar, mas valeu a pena. Tentei economizar. Ler poucas páginas ao dia. Impossível. O livro ficou grudado em minhas mãos e, enquanto não terminei, minhas horas de sono ficaram ainda mais reduzidas. 
Que me desculpem os que consideram a literatura policial um gênero menor. Discordo frontalmente. E usarei todas as armas que forem necessárias pra defender meu ponto de vista: de uma Glock 9mm a uma Leopold's Apple (vide The Leopard). 
Um bom romance policial tem tudo de melhor que há na literatura - trama interessante - com o plus das reviravoltas -, personagens redondos, pitadas de humor e, muitas vezes, um discurso bem construído.
Então, em vez de finalizar meus estudos pra prova de Estratégia de Empresa, eis-me aqui redigindo uma ode de amor ao Jo Nesbo e ao Harry Hole. Como eles, também não sou uma personagem linear ou plana. Deve ser por isso.  E, bom... nem preciso finalizar dizendo o quanto recomendo a leitura.
Minha nórdica paixão e eu.

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