terça-feira, 5 de maio de 2015

Visto

Estava na "fila da segurança" para entrar no consulado americano. Era a terceira das seis filas necessárias para passar pela entrevista. Antes mesmo de entrar no prédio, você é abordado de forma educada, mas não simpática, e é convocado a mostrar seus pertences. Melhor dizendo, a comprovar que entre os seus pertences não há nenhum aparelho eletrônico ou bomba. Quase fui reprovada na revista. O moço perguntou se eu trazia comigo celular, tablet ou carregador de bateria. Neguei veementemente. Então ele sacou de dentro da minha bolsa um pen drive:
- O que é isso?!
- Um pen drive... - respondi baixinho, imaginando de onde poderiam surgir os homens de preto que me levariam dali.
Mas ele apenas grunhiu "humpf", devolveu o dispositivo para dentro da bolsa e me mandou seguir para a segunda fila. Não era ainda a fila da segurança. Era a fila amarela.
Então, na terceira fila, a da segurança, apareceu um moço que realmente devia ser AQUELE.
- Eu já falei, eu já avisei... Tem que chegar aqui na porta SEM o cinto! Vocês deixam pra tirar o cinto quando chegam aqui! Atrapalham tudo! A fila não anda, por causa de vocês que deixam pra tirar o cinto aqui na frente, mas vocês não escutam, vocês não escutam! Eu JÁ falei - NÃO ENTRA DE CINTO! Por que vocês não tiram o cinto antes? Estão aí sem fazer nada! E olha, aparelho eletrônico NÃO ENTRA! Querem chegar até aqui e depois voltar pro começo da fila? Azar de vocês! Porque não vai entrar. NÃO vai. Já tiraram o cinto? Já tiraram? Vocês não me ouvem, não prestam atenção! Eu já avisei laaaaa atrás. Tem que tirar o cinto. NÃO ENTRA de cinto. Nem de celular! Estão entendendo?
O menininho atrás de mim deve ter passado a acreditar na história dos pais sobre não poder ir pra Disney porque ficou quietinho.
Comecei a ficar com medo de que o moço que tinha me deixado entrar com o pen drive não tivesse sido rigoroso o suficiente. Ele deveria ter me proibido de seguir adiante com o pen drive. Afinal, um pen drive não é um aparelho eletrônico? Tem saída USB!
Pronto. Ali dentro, as portas que o guardinha zelava com tanto fervor, seriam fechadas para mim. Sabe-se lá quando conseguiria voltar. O melhor seria me livrar daquele pen drive. Pensei em deixá-lo cair discretamente em algum lixo. Mas eles não iriam dar essa moleza. Um lixo é um ótimo lugar para se esconder uma bomba. Não havia nenhum por ali. Então cogitei atirar pra longe, pra rua, através das grades. Mas, eles poderiam achar que eu estava jogando algum tipo de explosivo. Não havia saída. Nem para mim, nem pro pen drive.
Chegou minha vez. A bolsa foi para o raio x. Esperei. A bolsa da mãe do menininho, também. O operador da esteira perguntou se a minha bolsa era minha e passou pela raio x mais uma vez. Meu coração disparou. Passou a da mãe também. Então me disse:
- Pode ir.
Dirigiu-se para a minha parceira de fila:
- A senhora ainda não. Está sozinha?
- Com meu marido e meu filho - ela respondeu, empalidecendo.
Não pude ficar para saber o que aconteceu. Avisei o marido:
- Seguraram sua esposa.
E segui em frente, em busca da nova fila, antes que alguém mudasse de ideia e me chamasse de volta achando que eu era cúmplice da família terrorista.
Por essa passei rápido e quase sem sofrimento. Quem estava sofrendo mesmo era um pequenino de uns três anos que, além de ter de aturar aquela situação estranha e desconfortável, ainda tinha de ouvir dos pais "ah, se você não se comportar, AQUELE moço não vai deixar você ir pra Disney!".
Com uniforme de guardinha, andava de um lado pro outro, encarando um a um, os pobres mortais que aguardávamos para sermos aceitos no Olimpo, discursando:
Daquele momento em diante, não vi mais os três. Não soube o que aconteceu.
Certamente a mãe deveria ter na sua bolsa algo perigoso como uma fralda, uma chupeta ou mamadeira. Bem pior que o meu pen drive.

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